domingo, 27 de julho de 2025

Todos somos diferentes (Série de Mensagens - Mãos à Obra) - Efésios 4:7-11

 


Rio de Janeiro, 27 de julho de 2025.

Série de Mensagens - Mãos à obra.

Tema da Mensagem - Todos somos diferentes

Texto Base - Efésios 4:7-11

Introdução:

·         A carta aos Efésios na verdade é uma carta encíclica;

·         Por ser uma carta encíclica, ela contém orientações gerais acerca de ortodoxia e ortopraxia;

·         Os primeiros três capítulos da epístola são extremamente doutrinários. O apóstolo se preocupa em apresentar a magnitude e a beleza de um Deus que à semelhança de um Pai adota filhos por amor. E, que adotar esses filhos concede-lhes presentes: salvação, identidade, herança, família, etc. Fazendo de pessoas totalmente diferentes um só povo, uma só família, sem nenhuma barreira entre essa nova família;

·         Os últimos três capítulos, o apóstolo Paulo se preocupa em orientar aos membros desta família como eles devem andar de forma digna agora que são filhos deste Pai. Ou seja, já que agora são integrantes desta família, devem andar de forma digna, de modo que honrem ao seu Pai;

"A cada um de nós foi dada a graça, conforme a medida com que Cristo distribuiu os dons." (Verso 7)

  • O apóstolo nos versos anteriores havia trabalhado a questão da unidade, os motivos que nos faziam iguais e pelo qual precisávamos lutar pela unidade. Agora ele começa a trabalhar, o que nos faz diferentes: os dons espirituais;
  • Todo cristão recebe de Deus pelo menos um dom para poder servir a Deus e aos para que Deus seja glorificado e a igreja edificada. Alguns detalhes são importantes para salientar: 1) todo cristão possui algum dom; 2) existe uma vasta variedade de dons; 3) É Jesus que distribui os dons; 4) todo crente precisa utilizar seu dom para servir a Deus e aos irmãos. Caso não aconteça, o corpo fica defeituoso;
  •  Como o cristão descobre seu dom? O cristão descobre seu dom na comunhão com os irmãos. Um dom não é algo para si mesmo, mas para o serviço do bom Rei e de sua igreja. Ao longo dos anos algumas ferramentas foram criadas para ajudar a identificar os dons que recebemos de Deus. Aqui em nossa igreja temos o curso de dons que nos ajuda através de um questionário a identificarmos quais são os nossos dons;

"Por isso é que foi dito: “Quando ele subiu em triunfo às alturas, levou cativos muitos prisioneiros e deu dons aos homens”. Ora, o que significa “ele subiu”, senão que também havia descido às profundezas da terra? Aquele que desceu é o mesmo que subiu acima de todos os céus, a fim de encher todas as coisas." (Versos 8 a 10)

 

  • "Sabemos que Cristo, através de sua morte, ressurreição e glorificação, eliminou as correntes do cativeiro satânico; isto é, a humanidade cativa a Satanás passou então a ser o espólio de Cristo. Assim nós, que fomos transferidos, segundo Colossenses 1.13, do império das trevas e de sua escravatura, tornando-nos escravos de Jesus Cristo e da sua justiça, segundo Romanos 6. Essa escravatura deve atuar no mundo e na igreja com essa individualização em forma de apóstolos, profetas, evangelistas, pastores, mestres e outras formas, tais como as que encontramos em 1 Coríntios 12 e em 1Pedro 4.10-11. Esta passagem sobre os dons mostra essa multiplicidade, sendo-nos possível recebê-los sob as ordens de nosso Senhor e na condição de escravos dele. Veremos agora como a obra de Cristo, que ele nos dá para fazer; se divide em dois aspectos." (Russell Shedd & Dewey M. Mulholland - pg. 53)
  •  "A esta altura, Paulo passa a um novo pensamento. "A proporção do dom de Cristo" eis a oferta abundante que o Senhor que subiu aos céus prometeu ainda nos dias da Sua carne, para quando retornasse à presença do Pai (Jo 14:12-14). Para expressar isto, o apóstolo cita as Escrituras, Salmo 68:18, passagem significativamente associada ao Pentecostes no lecionário da sinagoga (Bruce), e que poderia ser aplicada ao triunfo e ascensão do Senhor, seguidos pela concessão de dons espirituais à Sua Igreja. A ordem original das palavras do salmo retrata a volta triunfal do Senhor (seja ao santuário em Jerusalém, seja o próprio céu) após a derrota dos inimigos de Israel. Tornou cativos seus inimigos, os quais seguem-no em Sua procissão triunfal. Por ser o Conquistador recebeu dons (presentes) que pode ofertar. Este salmo, como muitos outros, encontrou pronta aplicação em Cristo. Conquistou seus inimigos e retornou triunfalmente ao trono de Seu Pai, desta vez para conceder bênçãos a seu povo. De fato, seus antigos inimigos, que conduz em triunfo (2 Co 2:14) entre os quais o próprio Paulo se inclui, são seus dons à Igreja." (Francis Foukes - Pg. 95)

"Ele designou alguns para apóstolos; outros, para profetas; outros, para evangelistas; outros, para pastores e mestres." (Versos 11)

  • William Hendriksen faz algumas observações pertinentes: 1) A intenção não é fornecer uma lista de dons e sim listar dons dados a "Oficiais", "Autoridade"; 2) Os dons dos líderes enfatizam o crescimento no serviço em amor e não o crescimento numérico; 3) Para que a igreja ser pujante e forte ela precisa ter não somente bons líderes, mas sim bons discípulos de Jesus; 4)Todos estes que são "Oficiais" devem servir a igreja com amor e não como obrigação; 5)Os "Oficiais" devem se lembrar que seus dons não são para seu próprio bem pessoal, mas para edificação da igreja;
  • Apóstolos - A palavra apóstolo foi usada em pelo menos 3 sentidos no Novo Testamento. 1) para os discípulos diretos de Jesus; 2) para os mensageiros; 3) para os irmãos que eram enviados para outros lugares para abrirem frentes de trabalhos missionários. No primeiro sentido, com suas atribuições especiais dadas por Jesus especificamente para aquele tempo se encerrou com a morte daquela geração. Acredito que a utilização melhor para o termo hoje seja a nossa ideia de missionários.
  • Profetas - O dom de profecia como inspiração se encerrou com o fechamento do Canon do Novo Testamento. A igreja já possui a direção de Deus registrada na Palavra. Devemos tomar muito cuidado com a busca de revelações, pois não devemos basear nossas vidas e nossa busca espiritual nesse sentido. Pois se somos desejos de saber a vontade de Deus devemos ler e estudar a sua Palavra. Em nossos dias profeta é aquele expõe a Palavra de Deus e direciona o povo de Deus a vontade de Deus.
  • Evangelista - Todo crente precisa evangelizar, mas nem todo crente possui dom de evangelismo. Os evangelistas nos dias em que o texto foi escrito eram irmãos que haviam sido dotados com esse dom e tornavam-se itinerantes pregando o evangelho pelos lugares que passavam. Podemos em nossos dias encontrar esse dom muito presente na vida dos missionários, capelães, pessoas dotadas com dom de evangelismo.
  • Pastores e Mestres - Estes dons são aqueles que são mais presentes na igreja local. Calvino destaca que as duas principais funções de um pastor é alimentar seu rebanho de forma saudável e protege-lo dos perigos espirituais. Todo pastor precisa ser um mestre, ser apto para ensinar. Os dois termos no original grego estão concatenados.

Somos todos iguais (Série de Mensagens - Mãos à Obra) - Efésios 4:1-6

 


Rio de Janeiro, 27 de julho de 2025.

Série de Mensagens - Mãos à obra.

Tema da Mensagem - Somos todos iguais.

Texto Base - Efésios 4:1-6

Introdução:

·         A carta aos Efésios na verdade é uma carta encíclica;

·         Por ser uma carta encíclica, ela contém orientações gerais acerca de ortodoxia e ortopraxia;

·         Os primeiros três capítulos da epístola são extremamente doutrinários. O apóstolo se preocupa em apresentar a magnitude e a beleza de um Deus que à semelhança de um Pai adota filhos por amor. E, que adotar esses filhos concede-lhes presentes: salvação, identidade, herança, família, etc. Fazendo de pessoas totalmente diferentes um só povo, uma só família, sem nenhuma barreira entre essa nova família;

·         Os últimos três capítulos, o apóstolo Paulo se preocupa em orientar aos membros desta família como eles devem andar de forma digna agora que são filhos deste Pai. Ou seja, já que agora são integrantes desta família, devem andar de forma digna, de modo que honrem ao seu Pai;

"Como prisioneiro no Senhor, peço a vocês que vivam de maneira digna do chamado que receberam." (Verso 1)

·         "Como prisioneiro no Senhor" - O apóstolo Paulo não se envergonha pela sua situação, na verdade ele se "orgulha" em ser digno de sofrer por amor a Jesus e a seu evangelho. Ele não só é prisioneiro por amor ao Senhor e seu evangelho, mas também é prisioneiro literalmente de Jesus. Existe um significado mais profundo nestas palavras de Paulo. Ele quer dizer que antes era "escravo" do deus deste presente século, e que agora foi comprado por um novo Senhor. Ele mesmo já disse escrevendo em outra de suas epístolas que foi transportado do Reino das trevas para o Reino do Filho do amor de Deus. Resgatar a compreensão de que todos somos servos, escravos, é essencial para o entendimento de quem somos e de quem Deus É;

·         "Peço a vocês que vivam de maneira digna do chamado que receberam" - A melhor tradução não seria um "Peço", "Rogo", mas sim um "Exorto", "Oriento". Pois trata-se de um imperativo. O verdadeiro crente precisa realmente viver como crente. Ele não tem opção de verbalizar que é crente e viver como um não crente. É isso que o apóstolo está dizendo. Se vocês realmente foram "salvos" e isso que ele quis dizer com "chamados", vivam conforme verdadeiros discípulos de Jesus. Um verdadeiro discípulo de Jesus precisa dar frutos, pois está conectado n'Ele;

 

"com toda humildade e mansidão; com paciência, suportando uns aos outros com amor. Façam todo o esforço para conservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz" (Versos 2 e 3)

·         Humildade - Como Paulo se declara um prisioneiro e como anteriormente já havia se identificado como o menor, o mais vil, blasfemo, e alguns outros adjetivos pejorativos. Ele o faz não por auto piedade, mas sim por entender quem realmente ele é, um pecador miserável que depende da graça de Jesus. Isso é humildade é reconhecer que não possui méritos, direitos, que é única e exclusivamente pela graça de Deus. A palavra grega utilizada pelo apóstolo denota exatamente um significado de vil, ignóbil, sentido de baixo. Para os gregos e todos os outros povos, humildade não é uma virtude, mas sim uma fraqueza;

·         Mansidão - A palavra grega utilizada para descrever mansidão "prautes" é oriunda da palavra "praos", um adjetivo, usado para descrever um animal submetido completamente a disciplina e ao controle. O homem que é manso deve estar totalmente sobre o controle de Deus e por isso ele é alguém que não reivindica seus direitos, sua importância ou sua autoridade. Ele está totalmente submisso a Deus que É seu Senhor e o justifica;

·         Longanimidade - A palavra "makrothimia" é usada em muitos casos para indicar uma firme paciência em meio ao sofrimento ou infortúnio. Também é muito usada como uma pessoa que é tardia em querer pagar o mal com o mal, uma pessoa mesmo sendo ferida demora a revidar;

·         Suportando - Nesta virtude concentra-se a longanimidade na prática. Por isso parece-me que existe uma junção entre estas duas virtudes, à semelhança das duas primeiras. Suportar significa ser clemente com as fraquezas e os erros dos outros, sabendo que também temos os nossos.

·         "Façam todo o esforço para conservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz" - Paulo parece ensinar que a unidade é algo que o Espírito Santo produz e não algo provocado por méritos humanos. Quando os irmãos vivem verdadeiramente o evangelho o vínculo é selado pelo Espírito e a paz Deus reina no seio de sua igreja. O esforço a que Paulo se refere deve ser em nos esmerarmos em sermos melhores cristãos a cada dia através da nossa relação com o Senhor Jesus.

 

"Há um só corpo e um só Espírito, como também uma só esperança quando foram chamados; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de todos, que é sobre todos, por meio de todos e em todos." (Versos 4 a 6)

·         Tendo falado sobre o que produz a unidade, o apóstolo agora irá falar sobre o fundamento da unidade;

·         "Muitas pessoas, hoje, esforçam-se para unir as religiões de forma não bíblica. Elas dizem: "Não estamos interessados em doutrinas, mas em amor". Dizem: "Vamos esquecer as doutrinas; elas só nos dividem. Vamos simplesmente amar uns aos outros": Mas Paulo não discute a unidade cristã sem antes falar do evangelho (capítulos 1 a 3). Unida-de edificada sobre outra base que não a verdade bíblica é o mesmo que edificar uma casa sobre a areia. A unidade cristã baseia-se na doutrina da Trindade: "Um só Espírito" (4:4), um só Senhor (4:5) e um só Deus e Pai de todos (4:6)." (Hernandes Dias Lopes, pg.105)

·         Um só corpo - Só existe uma igreja. Quando uma pessoa se converte ela automaticamente começa a fazer parte do corpo de Cristo;

·         Um só Espírito - Em todo crente regenerado habita o mesmo Espírito, o Espírito Santo;

·         Uma só esperança - Nossa esperança está no retorno glorioso de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo que fará nova todas as coisas;

·         Um só Senhor - Jesus é o Senhor de todo salvos e remidos pelo seu precioso sangue;

·         Uma só Fé - Nossa fé e a nossa crença, é o que cremos como cristãos. A nossa confiança depositada em Cristo Jesus nosso Senhor;

·         Um só Batismo - O Batismo dito aqui por Paulo não é a ordenança, mas sim o Batismo do Espírito Santo. Mas é quando o Espírito nos sela, nos une de forma mística a Cristo e a sua igreja;

·         Um só Deus e Pai - Deus é o Pai de Cristo e o Pai da Igreja. Jesus nos ensinou a invocá-lo dessa forma. Ele é o criador e sustentador de todas as coisas, mas também é nosso Pai Amoroso;

sábado, 21 de junho de 2025

5º Capítulo - A defesa da fé e o depósito da fé.

 


5º Capítulo – A defesa da fé e o depósito da fé.

1. A DEFESA DA FÉ.

“Meu propósito não é linsonjear-vos (…) mas requerer que julgueis os cristãos segundo o justo processo de investigação..

(Justino, o Mártir)

1.1. Introdução:

            Conforme falamos no capítulo anterior, a perseguição aos cristãos no segundo e terceiro século, não se deram de maneira sistemática. Ou seja, ela não tinha um padrão a seguir. Os cristãos que sofriam prisões, espancamentos e em outros casos o martírio, eram aqueles que eram acusados diante dos tribunais, com uma testemunha da acusação.

            Os cristãos sofriam muitas acusações conforme fora mencionado no capítulo anterior. Dentro do que refletimos, podemos concluir que, as acusações contra os cristãos eram de duas espécies: oriunda de rumores populares e outra oriunda de críticas por parte da classe “culta”.

            Os rumores populares principais eram: “acerca da festa do amor”, “acerca da ceia do Senhor” e “adoração ao asno crucificado”. Para refutar estas fantasias alucinógenas, bastava apenas o seu testemunho. No decorrer do momento que eram acusados, uma avaliação sobre sua conduta moral e vivência social iria refutar na pratica tal acusação falsa.

            Porém, as acusações derivadas da classe culta é que provocou maior alvoroço e despertamento da parte dos cristãos. Quando de fato começamos a examinar as considerações dos homens cultos que escreviam contra a fé cristã. Podemos perceber não só a questão religiosa sendo colocada em pauta. Mas, visualizamos a questão do preconceito no plano de fundo da história.

            A mente daquela determinada classe social maquinava da seguinte maneira: “Como homens e mulheres incultas, desprovidas de conhecimento, podem dizer que são detentores e conhecedores da verdade?”

            Esses homens que se achavam detentores do saber começaram a escrever uma série de tratados, confrontando a fé cristã acerca de sua dita verdade. Sua cosmovisão era que o pensamento cristão era derivado não da cultura grega ou romana, que em sua opinião eram as coerentes acerca do conhecimento, mas sim que sua cultura era proveniente dos judeus, incultos, que acreditavam nos contos de Moisés e seus profetas.

 

 

            Mas, o maior agravante nos escritos contra os cristãos, estava no fato da questão doutrinária. Eles começaram a questionar os rudimentos da fé cristã. Isso despertou a defesa da fé pelos chamados “apologistas”.

1.2. As heresias e o surgimento dos “apologistas”.

            No desejo de combater as heresias espalhadas, sugiram os maiores tratados teológicos do segundo e terceiro século. Os apologistas mais conhecidos são: “Aristídes, Justino Mártir, Taciano e Teófilo”. Seus tratados são extremamente importante para nós podemos entender como a igreja tratava acerca dos assuntos de seus dias na defesa de sua fé. As principais heresias por eles combatidas foram:

ü  A doutrina da Pessoa de Deus – Questionava-se a onipotência de Deus – da seguinte indagação – Os cristãos e os judeus dizem que seu Deus é Soberano, Onipotente. Mas contradizem-se, quando dizem que o mesmo está a todo o momento do seu lado, no seu dia a dia, participando de suas reuniões nas casas. Ou Deus é um ser que está acima de todos os outros seres, que está longe, distante de todas as coisas. Ou é um ser incherido e intrometido na vida dos cristãos?

ü  A doutrina da Pessoa de Jesus – Eles faziam as seguintes ponderações: Esse Jesus não era um malfeitor que foi morto pelos seus crimes? Esse Jesus não era filho de uma mulher? Se Jesus era filho de Deus, por que Ele morreu, ao invés de matar as pessoas que ali o estavam crucificando? Se Deus sabe de tudo, o que ele veio fazer na terra? Os cristãos dizem que haverá ressurreição. Como haverá ressurreição dos corpos queimados, decapitados, e outros que sofreram algum tipo de dano?

            Como os irmãos estão tomando conhecimento. Tais questionamentos não podiam ser respondidos apenas com uma simples negação. Precisava-se se construir um arcabouço teológico para elucidação de tais questionamentos. Afinal, eles precisavam também tomar ciência de que os cristãos não eram idiotas e pessoas que eram enganadas através de uma fábula a cerca de um homem chamado Jesus.

1.3. Fé cristã e cultura pagã.

            Os cristãos por serem acusados de serem pessoas bárbaras e desprovidas de conhecimento, se sentiram obrigados a discutir a tensão existente entre a sua fé e a cultura pagã. Naqueles dias o pensamento cristão era muito radical no que diz respeito a manutenção de sua fé. Toda questão que parecesse ameaçar o culto único a Deus e a Jesus Cristo, era assunto a ser tratado e a ser inquerido pelos cristãos.

            Com a rejeição da cultura pagã, gerou-se um conflito acerca das obras produzidas pelos maiores pensadores humanos existentes. Nessa rela de pensadores entrariam nada a mais, nada menos que: Sócrates, Platão, Aristóteles, os estóicos, etc. Se eles aceitassem estavam aderindo a cultura pagã se não, estavam sendo fiéis aos princípios da fé cristã. Isso gerou dois caminhos na cosmovisão dos cristãos do século segundo. Uns foram totalmente contra a terem parte com a filosofia e outros conseguiram conjugar as duas coisas de modo coerente e seguro.

ü  Não aderiram a filosofia – Taciano discípulo de Justino Mártir, em sua obra “Discurso aos Gregos” defendeu a tese de que não existiria a minima possibilidade de se conjugar a filosofia e a teologia. Outro que pensava da mesma forma era Tertuliano já no século III, expressou seu pensamento em uma de suas frases, ou se não, a mais famosa: “Que tem Atenas a ver com Jerusalém? Ou que tem a ver a Academia com a Igreja?”

ü  Aderiram a filosofia – Justino o mestre de Taciano tinha uma outra cosmovisão a cerca do pensamento de seu discípulo. Antes de se converter ao Cristianismo Justino procurou a verdade dentro do pensamento clássico, e não encontrou. Encontrando o mesmo no evangelho. Porém, esse seu conhecimento da filosofia clássica, deu ao mesmo uma outra cosmovisão acerca do assunto em questão. O que em nenhum momento interferiu em sua fé, em sua convicção doutrinária. Isso se demonstra de modo prático com o seu martírio.

 

1.4. O pensamento de Justino

            Justino conseguiu enxergar vários pontos em que a filosofia clássica estava de acordo com sua fé. Abaixo iremos expôr algumas de suas percepções:

ü  Um ser supremo – Tanto o pensamento filosófico e a sabedoria cristã acordavam existir um ser Supremo, que criou e sustenta todas as coisas pelo seu poder.

ü  Vida além da morte – Tanto Sócrates, como Platão acreditavam na existência da vida após a morte, a semelhança da fé cristã. Não entraremos na questão de como ela se desdobrava em seu pensamento. Porém o que estamos fazendo um paralelo é na questão da vida após morte.

ü  A existência de outro mundo – Platão em seus escritos falou sobre a existência de outro mundo que caminha paralelo a este, encontramos semelhança no pensamento cristão acerca do Reino de Deus.

ü  A doutrina do Logos – O pensamento grego acreditava que toda nossa mente consegue compreender o porquê de alguma maneira é auxiliada na construção pelo “logos”, ou a “razão universal”. João vai utilizar-se dessa expressão em seu evangelho. João vai dizer Jesus é a razão do universo. Justino diz que os pagãos conheceram em parte o conhecimento dado pelo Logos de Deus.

 

1.5. Os argumentos apologistas.

            Vamos nesta seção tentar explanar os principais argumentos sobre as acusações que os cristãos sofriam:

ü  Acusação de serem ateus – Os apologistas respondiam a essa acusação retornando a mesma aos próprios pagãos. Eles diziam que entre eles (os filósofos) existiam pensadores que acreditavam que deuses eram inversões humanas, que seus vícios eram os piores praticados. Outro pensador vai dizer que os gregos invetaram os deuses para darem vasão aos desejos pecaminosos de sua carne. Outra apologia é ao fato de alguns deuses serem apenas estátuas que carecem de proteção humana. Sendo assim: Como isso pode ser considerado um Deus?

ü  Ressurreição – Os apologistas respondem a esta questão apelando para à onipotência divina. Se crermos que Deus fez todos os corpos do nada, porque não podemos crer que Ele não possa reconstruí-los novamente?

ü  Quanto as acusações de imoralidade – Os padrões de moralidade dos cristãos eram muito altos para serem acusados do mesmo. Por exemplo; como um cristão poderia matar uma criança em um ritual. Se si quer ele podia matar? Como os cristãos poderiam praticar imoralidades sexuais. Se si quer os pensamentos imorais devem ser descartados?

ü  As acusações contra o imperador e contra a sociedade – Eles se defendiam da seguinte forma. Os cristãos não adoravam ao imperador, mas não só o imperador, mas nenhuma outra criatura na terra. Eles só poderiam adorar ao Senhor Criador. Mas, que o fato deles não o adorarem não os fazia súditos menos leais que os demais. Sua submissão era provada até mesmo no fato de suas orações pela vida do imperador. E por serem cristãos, aplicavam a Palavra de Deus em suas vidas, e a Palavra de Deus diz que os que estão sujeitas as autoridades devem estar submissos a ela.

            Os cristãos vivem em uma intensa tensão. Entre uma rica cultura oriunda do paganismo, mas que deve ser descartada em alguns aspectos. Os cristãos aceitam a filosofia porém reconhecem na fé cristã a verdade suprema e absoluta para os povos a sua volta.  Encontramos esta tensão descrita no “Discurso de Diogneto”:

“Os cristãos não se diferenciam dos demais por sua nacionalidade, por sua linguagem nem por seus costumes (…) Vivem em sues próprios lugares, mas como transeuntes, peregrinos. Cumprem todos os seus deveres de cidadãos, mas sofrem como estrangeiros. Onde quer que estejam encontram sua pátria, mas sua pátria não está em nenhum lugar (…). Se encontram na carne. Vivem na terra, mas são cidadãos dos céu. Obedecem todas as leis, mas vivem acima daquilo que as leis requerem. Amam a todos, mas todos os perseguem.”[1]

2. O DEPÓSITO DA FÉ.

“O erro nunca se apresenta em toda sua nua crueza, a fim de não ser descoberto. Antes veste-se elegantemente, para que os incautos creiam que é mais verdadeiro do que a própria verdade”.

(Irineu de Leão)

            Pelo evangelho não fazer distinção ente as pessoas, o mesmo cada vez mais ganhava adeptos de todos os povos e nações. Com tanta gente que se convertia, ia crescendo a igreja diariamente em diversidade cultural. Estes irmãos ao se converterm traziam em suas bagagens culturas e costumes que deveriam ser analisados aos óculos da Palavra de Deus.

            A variedade de culturas sem sombra de dúvidas é enriquecedor. No entanto, nada, nem mesmo uma cultura, pode contraria os princípios e valores do Livro Sagrado. Isso de fato era um perigo devido a época em que está se vivendo. Muitas pessoas não se convertiam somente ao Nesta seção vamos tentar expor alguns destes perigos detectados a fé cristã:

2.1 GNOSTICISMO.

            Sem sombra de dúvidas o gnosticismo foi o principal inimigo enfrentado pela fé cristã nos primeiros três séculos de vida da igreja cristã. O gnosticismo foi um movimento que existiu não somente dentro do seio da igreja, mas também fora dela. O que dificultava ainda mais o combate do mesmo.

            O gnosticismo não tinha uma doutrina sistemática padrão. Ou seja, eles divergiam entre eles mesmos, cada um tinha uma particularidade. Seus principais defensores foram: Brasílides e Valentino. Por sua grande diversidade fica difícil ao historiador distingui-los entre si.

            A palavra “gnosticismo” vem da palavra grega “gnosis” que significa conhecimento. Eles diziam serem portadores de uma doutrina derivada de um conhecimento especial. Sua filosofia era permeada no fato de eles dizerem existir patamares especiais, aonde os adeptos através de experiências místicas, iam galgando degraus até chegar ao “aion” absoluto e alcançar a salvação do mundo mau.

            Os gnósticos deram origem a doutrina que ficou conhecida por “docentismo”. Vejamos um conceito acerca do significado deste termo:

“Em primeiro lugar; podemos mencionar as negações da humanidade de Jesus Cristo, que seriam o docentismo, o apolinarianismo e o eutiquismo.

Para os docetas, adeptos de ume heresia surgida em fins do primeiro século, Cristo não foi plenamente encarnando na carne, pois a matéria é intrinsicamente má. As epístolas de Colossenses e João argumentam contra essa noção pré-gnóstica. Esta posição tem reaparecido no ensino dos evangelistas da prosperidade.”[2]

            Com o pensamento de Jesus não ter a natureza humana. Os gnósticos quebraram uma série de doutrinas rudimentares da fé cristã: criação, encarnação, morte e ressurreição, etc. Os principais líderes cristãos dos três primeiros séculos da igreja se dedicaram a combater esta heresia.

2.2. MÁRCIOM.

            Filho do bispo de Sinope, lugar onde conheceu a fé cristã. Em 144 fundou sua própria igreja, após ter se espalhado a fama de suas doutrinas heréticas.

Uma de suas doutrinas era a diferenciação do Jeová do Velho Testamento e o Deus Pai de Jesus do Novo Testamento. Em sua cabeça o Jeová é um ser que é Justo, o criador do mundo, que por ser um ser inferior criou um mundo mau, corrompido. Em seu pensamento, Deus (o Pai de Jesus) não queria criar um mundo de forma corpórea (material) e sim espiritual. Que Jeová, por maldade ou por ignorância criou. Jesus então teve que vir ao mundo para salvar –nos de mundo corrompido.

Para Jesus não ser parte da humanidade, que em sua concepção é mau, por ser matéria. Não veio ao mundo encarnado, através do nascimento virginal de Maria esposa de José. Em sua concepção Jesus apareceu já maduro no reinado de Tibério. Para eles o Pai de Jesus, o verdadeiro Deus, é o avesso do Jeová, Ele é um Deus amoroso, perdoador. E logicamente se Deus é amor, no final não haverá nenhum julgamento, todos serão perdoados.

Logo se Jeová é diferente do Deus e Pai de Jesus, o Antigo Testamento não tem serventia para os ensinos deste herege. Sendo assim, ele se desfaz do Velho Testamento e também só vai adotar para os seus ensinos e mensagens, o evangelho de Lucas e os escritos de Paulo o apóstolo. Em sua concepção os apóstolos eram judeus. E por este motivo eles não conseguiram captar a real mensagem do evangelho transmitido por Jesus. Marciom chegou a dizer que foram os judeus que incluíram o Velho Testamento e os outros livros do Novo Testamento no cânon.

 

2.3. A RESPOSTA DA IGREJA: O CÂNON.

            Devido aos ataques hereges de Márciom. Os líderes das comunidades cristãs começaram a querem ter respaldos sobre a certeza de que livros eram realmente inspirados e deveriam ser base para suas ministrações e ensinos.

            Os judeus utilizavam o Velho Testamento como seu livro sagrado. Os cristãos receberam está herança dos judeus. Naquela época a versão usada tanto pelos cristãos como pelos judeus do Velho Testamento, era a Septuaginta, que era a tradução da língua hebraica para o grego.

            A construção da lista do cânon no início não se deu formalmente. Não houve uma reunião, também não foi convocado um concílio para debater o assunto inicialmente. Mas através da condução do Espírito Santo sobre sua igreja, foi havendo um consenso geral (fora os hereges) sobre quais eram os livros a serem adotados em suas comunidades como inspirados.

            O Antigo Testamento era aceito por todos os cristãos com exceção lógica dos heréticos gnósticos e marcionitas. Porém, para os cristãos a pessoa de Jesus era o cumprimento do que Deus iniciou a fazer através de Israel. Jesus era a promessa cumprida. E por este motivo o Antigo Testamento em nada desmerecia o Cristianismo. Pelo contrário, ele apontava para a pessoa de Jesus.

            O Novo Testamento foi tomando forma aos poucos. Inicialmente os evangelhos foram os primeiros escritos que foram aceitos pelas comunidades cristãs. Vejamos o que diz González:

“Junto aos evangelhos, o livro de Atos e as epístolas paulinas conseguiram aceitação geral desde muito cedo. Outros livros, tais como o Apocalipse, a Terceira Epístola de João, e a Epístola de Judas, demoraram mais tempo em ser universalmente aceitos. Mas já nos fins do século segundo a maior parte do Novo Testamento tinha vindo formar parte das Escrituras de todas as igrejas cristãs: os quatro evangelhos, Atos e as epístolas Paulinas.[3]

 

2.4. A RESPOSTA DA IGREJA: O CREDO.

            Outra resposta da igreja as heresias como a de Marcion e dos gnósticos foi a formulação do credo apostólico. Existe uma lenda que remonta a construção do credo ao tempo dos apóstolos. Porém, o mesmo inicia sua repercussão em meados do século segundo.

            Inicialmente apareceu como “símbolo da fé”. A palavra símbolo naquele contexto e época não tem o sentido que tem para nós hoje. O entendimento daquele momento histórico era que um símbolo era um meio para que houvesse um reconhecimento. Logo o símbolo da fé era um meio que os Cristãos tinham de se reconhecerem.

            Um exemplo deste fato é o batismo. Existiam três perguntas básicas para o candidato ao Batismo:

            Crês em Deus Pai Todo Poderoso?

            Crês em Jesus Cristo, o filho de Deus, que nasceu do Espírito Santo e de Maria, a virgem, que foi crucificado sob Pôncio Pilatos, e morreu, e se levantou de novo ao terceiro dia, vivo dentre os mortos, e ascendeu ao céu, e se sentou à destra do Pai, e virá a julgar os vivos e os mortos?

            Crês no Espírito Santo, na santa igreja, e na ressurreição da carne?

            Ao observar-nos o texto acima, podemos entender que trata-se do núcleo do que ficou conhecido como “credo apostólico”. Outro fato notório era a ênfase na Trindade, isso comprovava a ortodoxia da práxis do Batismo.

            Porém, se observarmos com mais cuidado, iremos perceber que nas minúcias existia a preocupação com o combate as heresias de Márcion e dos Gnósticos. No credo que ficou conhecido por nós, foi incluso dos termos chaves no mesmo. São eles: “a santa igreja” e “ressurreição da carne”.

            “A santa igreja” para denotar o fato de que a igreja receberá de Jesus o “depósito da fé”. E a mesma era a autoridade de Deus para a proclamação e expansão do Reino de Deus. E a “ressurreição da carne” para combater a crença de que a matéria é má. A fé cristã não é meramente espiritual, mas incluí a ressurreição do corpo.

 

2.5. A RESPOSTA DA IGREJA: A SUCESSÃO APÓSTOLICA.

            As questões que eram debatidas sempre eram oriundas do fato de alguém se dizer portador do real evangelho: Os marcionitas diziam que Paulo era o apóstolo que realmente entendeu o sentido do cristianismo e expurgou de seus ensinos os preceitos judaicos. Os gnóticos diziam que Jesus deixou a “tradição secreta” com um dos apóstolos, muitos diziam ser este Tomé, por causa do evangelho que carregou seu nome. Os cristãos diziam-se portadores da são doutrina, pois a herdaram dos apóstolos.

Afinal de contas quem realmente recebeu o verdadeiro evangelho dos apóstolos. É nessa questão que entra a importância da sucessão apostólica. De forma lógica, se Jesus tinha algum ensino secreto, ele o teria confiado aos seus apóstolos, pois foi a eles a quem Ele confiou à direção da sua igreja. E se realmente os apóstolos tivessem recebido algum segredo, eles dariam continuidade a esta tradição passando para os seus discípulos diretos, e não para estranhos.

Logo se os discípulos diretos dos apóstolos negavam terem recebido tais tradições dos mesmos. Pode-se entender que os hereges dizem ser um ensino secreto, não passa de uma heresia que deve ser combatida e extirpada do seio igreja. Para que este raciocínio lógico fosse de fato aceito, era necessário que fosse comprovado a árvore genealógica. O que não era difícil por que as igrejas possuíam uma lista de sucessão de seus líderes a contar de seu nascimento.

2.6. A IGREJA CATÓLICA ANTIGA.

            A palavra católica começou a ser utilizada pelos cristãos autênticos para denotar duas faces do verdadeiro Cristianismo: a primeira era que a palavra denotava o sentido universal da igreja, diferentemente dos gnósticos que eram um grupo pequeno e específico. O outro era o fato da “igreja ser um todo”, ou seja, ela toda tinha consenso sobre o real evangelho, diferentemente dos marcionitas, que em uma pequena parte, diziam ter uma revelação especial.

            Esta palavra foi empregada para designar estes fatores acima citados para denotar a autoridade da igreja como despenseira da fé.  Em nossos dias esta palavra tem sido utilizada para denotar uma porção específica da chamada “cristandade”, ganhando um outro sentido do qual a mesma fora utilizada a partir do século segundo.

 

           

           

 

 

                       

 



[1]    GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. pág.94

[2] FERREIRA, Franklin. MYatt, Alan. Teologia Sistemática: uma análise histórica, bíblica e apologética para o contexto atual. São Paulo: Vida Nova. 2007. pg. 487.

[3] GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. pg.102.

4º Capítulo - Os primeiros conflitos com o estado e a perseguição do segundo século

 


4º Capítulo – Os primeiros conflitos com o estado e a perseguição do século segundo.

2. A PERSEGUIÇÃO DO SÉCULO SEGUNDO:

“Estou começando a ser discípulo... o fogo e a cruz, multidões de feras, ossos quebrados (…) tudo hei de aceitar, contanto que eu alcance a Jesus Cristo.

(Inácio de Antioquia)

            O primeiro século deu início as perseguições sobre a igreja. Já nas primeiras perseguições observamos em nossas pesquisas o martírio de muitos irmãos que haviam entregues suas vidas ao Senhorio de Jesus.     

            Porém com o passar dos anos os martírios foram aumentando. E o que mais nos detalha sobre este fato são documentos que podemos encontrar no século segundo que narram muitos destes episódios sombrios da espécie humana.

            Um destes documentos ficou conhecido como a “ata dos mártires”. Eram descrições que continham detalhes sobre as prisões, encarceramento, julgamento do mártir e sua morte. Algumas atas são tão detalhistas que parecem terem sido copiadas do próprio processo penal. Outras parecem terem sido escritas após a morte dos mártires. Mas estas atas são um dos mais valiosos documentos da igreja cristã.

            Existem também outros documentos escritos por cristãos que de alguma forma possuem relacionamento com os martírios e as perseguições. Um bom exemplo deste aspecto são as sete cartas escritas por Inácio de Antioquia a caminho do martírio. Outro bom exemplo é encontrado em correspondências entre os governantes, ou de governantes com pessoas ligadas a eles por algum motivo. Nestes documentos nós encontramos as atitudes dos pagãos para com os cristãos, e mais especificamente a atitude de seus governantes. Uma citação que podemos fazer é a correspondência de Plínio, o Jovem e o imperador Trajano.

2.1. A correspondência de Plínio, o Jovem e o imperador Trajano.

            Plínio Segundo, o Jovem, foi governador da Bitínia, atualmente hoje chamada de Turquia. Ele foi nomeado em 111 d.C.  As fontes históricas irão dizer que Plínio era um homem justo, cumpridor das leis e das tradições romanas. Logo que assumiu sua posição governamental. Plínio recebeu uma lista de acusações contra alguns cristãos que residiam em sua cidade. Por sua falta de experiência, intentou fazer uma pesquisa em como proceder para a realização do julgamento dos mesmos. É então que ele escreve a carta ao imperador Trajano.

            A sua carta a Trajano nos traz alguns detalhes muito interessantes. Por exemplo parece que existiam um número consideráveis de cristãos. A citação que consta este assunto é a seguinte: “o contágio desta superstição penetrou, não só nas cidades, mas também nos povoados e nos campos”.[1]

             Em seus primeiros julgamentos Plínio começou a chamar os primeiros cristãos. Ele os pressionava a negarem a Cristo. Aqueles que negavam, ou diziam que já haviam abandonado sua fé. Ele exigia dos mesmos que invocassem aos deuses, que adorassem ao imperador e que maldissessem a Cristo. Quem realizava tais procedimentos, era posto em liberdade. Ele diz exatamente isso a Trajano neste trecho: “é impossível obrigar aos verdadeiros cristãos fazerem estas cousas”.[2]

            Aos que se recusavam a negar sua fé. O imperador sentenciava-os a morte. Não com a acusação de serem cristãos, mas sim com a acusação de obstinação e desobediência ante ao representante do imperador.

            González relata em seu livro as acusações que os cristãos recebiam. Diz ele:

“Tanto uns como outros, contaram ao governador o mesmo testemunho: Seu crime consistia em se reunir para cantar antifonalmente hino: “a Cristo como Deus”, para fazer voto de não cometer roubos, adultérios ou outros pecados e para uma refeição em que não se fazia cousa alguma contrária a lei e aos bons costumes. Já que algum tempo antes, seguindo as ordens do imperador, Plínio havia proibido as reuniões secretas, os cristãos já não se reuniam como antes. Perplexo diante de tais informações, Plínio fez torturar duas escravas que eram ministras da igreja; mas ambas as mulheres confirmaram o que os demais cristãos haviam dito. Tudo isto representava ao governador um problema difícil de justiça e jurisprudência: devia castigar aos cristãos só por levarem esse nome, ou era necessário provar algum crime?”[3]

            A resposta do imperador a Plínio era que cada caso era um caso. Que o mesmo não deveria gastar suas forças em buscar a saber das acusações. Mas que só tomasse partido das mesmas se chegassem ao seu conhecimento por acusações de testemunhas existentes. Diante dos fatos é que ele deveria analisar se era realmente verídico que se recusavam a adorar aos deuses.

            Tertuliano, o advogado cristão, cem anos depois com este pensamento ainda vigente vai tecer o seguinte comentário: “Oh! Sentença necessariamente confusa! Nega-se a buscá-los como a inocentes; e manda castigá-los como culpados. Tens misericórdia e és severa; dissimulas e castigas. Como evitas então censurar-te a ti mesma? Se condenas, por que não investigas? E se não investigas, por quê não absolves? (Apologia 2)[4]

            Por mais que a resposta de Trajano não tivesse sentido lógico. Havia o sentido político. Ele sabia que Plínio tinha razão em suas indagações. Os cristãos não representavam nenhum perigo ao estado. Porém, quando acusados com testemunhas de não adorarem ao imperador. Isso poderia enfraquecer o poder do Estado e aos poucos minar o poder do imperador. Até porque uma das coisas que mantinha o império unificado era o culto ao imperador. O poder da religião exerce uma grande influência com toda certeza.

            Essa política de Trajano perdurou por todo o segundo século e por uma boa parte do terceiro século também. Podemos encontrar esta filosofia permeada nas sete cartas de Inácio de Antioquia.

2.2. Inácio de Antioquia: o portador de Deus.

            No ano 107 d.C., o bispo de Antioquia, Inácio, fora condenado à morte por ter se recusado a adorar aos deuses do império. Roma nestas circunstâncias estava em festa. Devido a vitória sobre os dácio. Inácio fora levado a Roma para ser um dos espetáculos destas comemorações. Em seu trajeto ao martírio ele escreveu as sete cartas, um dos domingos mais preciosos da história da igreja cristã.

            Inácio nasceu entre os anos 30 e 35 d.C., isso nos dá a dimensão que quando selou o seu martírio já era um ancião. Em suas cartas ele mesmo se intitula o “Portador de Deus”, o que denota o respeito e autoridade que o mesmo desfrutava diante da comunidade cristã. Mais tarde com algumas pequenas mudanças literárias em seu texto ficou sendo chamado como, “levado por Deus”, daí surgiu a lenda de que ele era o menino que Jesus havia colocado em seu colo quando as pessoas o rodeavam. (Marcos 10:13-15). Inácio também desfrutava do respeito de ser no início do segundo século o segundo bispo de maior influência, haja vista que sua comunidade cristã era a segunda comunidade cristã mais antiga.

            Em sua peregrinação a Roma, o velho bispo e os soldados que o acompanhavam passaram pela Ásia Menor, nestas passagens, muitos cristãos procuravam estar com Inácio, e foram nestas visitas que surgiram a maioria do conteúdo das literaturas de Inácio.

            Inácio ficou sabendo do plano de alguns irmãos de o resgatarem então pediu que desistissem do plano. Pois eles poderiam estar atrapalhando os desígnios de Deus. Diz ele em sua carta: “Temo vossa bondade, que pode me causar dano. Pois vós podeis fazer com facilidade o que projetais; mas se vós não prestardes atenção ao que vos peço, ser-me-á, muito difícil alcançar a Deus (Romanos 1.2).”[5]

            Inácio não queria ser reconhecido por seu sacrifício. Mas sua intenção era ser um imitador autêntico de seu Senhor. Que havia pagado com sua própria vida. Outras frases marcaram a carreira cristã de Inácio são elas:

Sou trigo de Deus, e os dentes das feras hão de me moer, para que possa ser oferecido como pão limpo de Cristo”.[6]

“Meu amor está crucificado (…) Não me agrada mais a comida corruptível, (…) mas quero o Plano de Deus, que é a carne de Jesus Cristo (…) e seu seu sangue quero beber, que é bebida imperecível”.

“quando eu sofrer, serei livre em Jesus Cristo, e com ele ressuscitarei em liberdade”.

            Inácio segundo a tradição morreu em Roma ao ser jogado aos famintos leões. Algum tempo depois Policarpo bispo de Esmirna escreveu aos crentes de Filipo perguntas sobre a sorte do companheiro. Porém não encontramos em nenhum documento histórico respostas a suas indagações.

2.3. O martírio de Policapo.

            Em meio ao ano de 155 d.C., ainda estava valendo a política apresentada a Trajano ao seu governador Plínio. Este por sua vez.  Policarpo era bispo de Esmirna, quando se iniciou, uma série de acusações contra os membros de sua igreja. Os relatos eram que os cristãos eram submetidos as torturas mais bárbaras, mas não negavam a Cristo.

            Foi quando chamaram um ancião chamado Germânico a presença do juiz. E este não negou a sua fé. Quando o juiz incitou a multidão contra o ancião o mesmo não negou a sua fé, e começou a ser chamado de Ateu, por acreditava em um Deus invisível e um Deus apenas. Mas acrescentaram ao fato de chamarem-no de Ateu o pedido de trazer Policarpo diante do tribunal. Haja vista que ele era o líder do movimento naquela região.

            Quando Policarpo soube da situação, fugiu. Ainda por umas três vezes trocou sua localização. Pois alguns se rendiam ao império e deduravam ao bispo. Porém em uma dessas ocasiões Policarpo decidiu não mais fugir e foi capturado e levado ao juiz.

            Diante do juiz, Policarpo foi orientado a negar sua fé. Sendo pressionado pelo inqueridor e também pela multidão a sua volta. Porém o mesmo deu a seguinte resposta ao juiz:

Vivi oitenta anos e seis anos servindo-lhe, e nenhum mal me fez. Como poderia eu maldizer ao meu rei, que me salvou?”[7]

            O juiz ainda insistiu. Pediu que Policarpo apresentasse a multidão sua defesa contra as acusações. O bispo, porém, disse que a mesma não era digna de ouvir tal coisa. O juiz então o ameaçou com as feras, com fogo, e com muitos outros tipos de tortura. Porém, o experiente ancião respondeu que o fogo que o juiz acenderia só poderia durar um tempo. Mas o mesmo não se compararia ao fato de passar a eternidade em sofrimento continuo, por um fogo que jamais se apagaria.

            Com isso o bispo de Esmirna fora queimado vivo, mas antes de morrer elevou seus olhos aos céus e orou dizendo: “Senhor Deus Soberano (…) dou-te graças, porque me consideraste digno deste momento, para que, junto aos teus mártires, eu possa ser parte no cálice de Cristo. (…) Por isso te bendigo e te glorifico (…) Amém.”[8]

 

2.4. A perseguição sob Marco Aurélio

            Marco Aurélio no ano de 161 d.C., assumiu o império. O mesmo fora adotado anos antes por seu predecessor, Antônio Pio. Diferente de Nero e Domiciano, Marco Aurélio ficou conhecido por sua erudição e conhecimento. Seu espírito culto e erudito o levaram a construir em seus pensamentos uma coleção de escritos pessoais, que levou o nome de “Meditações”.

            Ao contrário do se que se podia imaginar acerca da relação deste refinado imperador a os cristãos, ele desencadeou sobre a igreja do Senhor Jesus uma terrível perseguição. Nos primeiros anos do reinado de Marco Aurélio o povo sofreu inúmeras tragédias: invasões, inundações, epidemias e etc., logo começou um boato que a culpa de todas estas coisas era dos cristãos. Então Marco Aurélio desencadeou uma enorme perseguição aos mesmos os culpando por tais fatos.

            Entre os mártires que mais ganharam fama estão Felicidade uma viúva, Justino o Mártir e Blandina.

2.5. Até o fim do século segundo.

            Marco Aurélio morreu no de 180 d.C., e seu sucessor foi Cômodo. Que governou em um período muito tumultuado por guerras civis, o que para os cristãos resultou em uma relativa paz, mesmo ainda existindo casos de martírios esporádicos.

            No século segundo a igreja sofreu forte perseguição. Mesmo que essa não se desse em toda a extensão territorial do império romano.

 



[1]    GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pág. 62.

[2]    GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pág. 63.

[3]    GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pág. 64.

[4]    GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pág. 64.

[5]    GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pág. 68.

[6]  GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pág. 68.

[7]  GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pág. 70.

[8]    GONZÁLEZ, Justo. A era dos mártires: uma história ilustrada do cristianismo. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pág. 72.

Todos somos diferentes (Série de Mensagens - Mãos à Obra) - Efésios 4:7-11

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