A tarefa pastoral de criar Histórias (Rute).
Introdução:
O reverendo Eugene Peterson é um especialista em teologia pastoral, se assim podemos dizer acerca do ministério pastoral. Sua experiência ministerial junto ao seu academicismo, com a ênfase em teologia pastoral o fizeram um homem de grande relevância para o Cristianismo.
Conhecido como Pastor de Pastores, o autor traz em seu currículo literário obras como A maldição do Cristo Genérico, A vocação Espiritual do Pastor, Um pastor segundo o coração de Deus, O Pastor desnecessário e muitos outros de igual quilate.
No capítulo que coube a nós refletir com intuito de explaná-lo em sala de aula, o autor com maestria aborda o livro de Rute. O Sr. Eugene faz uma aplicação do contexto em que o livro é lido pelos judeus, na ocasião da festa do Pentecostes, e aplica à prática do ministério pastoral e das atribuições do ministro em levar o seu rebanho a participar da História da redenção de Deus.
O autor nos mostra como cada ovelha deve interagir no correr da história da humanidade, no que tange ao plano da salvação de Deus, e como cada um de nós fazemos parte dele.
Decidimos seguir a divisão do autor em seus pontos, a fim de facilitar o entendimento do texto.
Toda Semana o pastor faz uma caminhada.
No saguão, o pastor se encontra subitamente em um momento que, embora diste apenas alguns passos do santuário, não é de adoração serena, não reflete a confiança unânime, não é obediente em amor. Ali não se conhece mais a salvação de forma inequívoca e aberta. No púlpito a Palavra de Deus dirigiu o culto. No Saguão, os pecados da congregação preenchem a agenda pastoral para uma semana de visitas, aconselhamentos, consolo e orientação. (Página 75)
O autor faz diversos paralelos sobre as muitas atribuições do ministério pastoral. Peterson de uma forma magistral traz às nossos vistas a dificuldade de um pastor em conciliar e lidar com suas emoções e sentimentos. E não bastando os seus, também tem que lidar com sentimentos e emoções de suas ovelhas; e, além disso, influenciá-las a terem uma participação na história que está sendo escrita pelo próprio Deus.
Mesmo em meio a todo este cenário construído, encontramos o Deus que rege todo o Universo, e que também por sua vez rege a história de cada um de nós. O autor dentro da cosmovisão criada em seu texto levanta o seguinte questionamento: “Como levar as pessoas a entenderem o propósito de Deus em suas vidas, e no plano da Salvação?”.
Rute e a Festa de Pentecostes
Assim como “no saguão de entrada” o pastor se depara com uma gama de confusões. O livro de Rute foi escrito em uma época em que a confusão de pensamentos e atitudes eram encontradas em Israel.
Esse paralelo ao ministério pastoral é de grande valia, de modo que, o pastor, no seu dia a dia, encontra uma realidade caótica conforme descrita.
O livro de Rute conta história de pessoas simples que interagem na história de Deus. Em contraponto a outros livros canônicos, o livro de Rute não demonstra tanta expressão, pois não possuí reis como Davi e Salomão, não apresentam profetas como Elias, Eliseu ou Jeremias e não têm histórias de líderes de tanto “sucesso” como José, Moises e Daniel. No entanto, narra à história de um fazendeiro e duas viúvas que são tão importantes para Deus quanto aqueles supramencionados reis, profetas e líderes.
O final do livro nos conta a continuação de sua genealogia, o que nos demonstra que o que aos nossos olhos não possui relevância e importância, aos olhos do Eterno fazem parte de um planejamento divino, o qual cada um desempenha um papel no grande elenco da salvação.
O autor fala o porquê em sua concepção, o livro de Rute ser lido em meio à festa de Pentecostes, que traz a lembrança a Eleição e a Aliança de Deus com Israel.
No Sinai, Israel descobriu a estrutura e a orientação para a vida remida. O passado estava definido, o futuro estabelecido e a conduta cotidiana do povo foi ali ordenada dentro dos limites da aliança. Tornara-se claro que a vida do povo não era uma série aleatória de experiências arbitrárias, casuais e imprevisíveis. (página 78)
O Sinai trata exatamente de duas esferas. A primeira é que Deus em Sua Santa Soberania elegeu a Israel, e a segunda é que tudo o que este Israel faz tem aplicações diretas na história de Deus e do Seu plano de salvação da humanidade.
Era muito nítida a diferença de Israel para os povos e nações que ao seu redor habitavam. Israel era o único povo que não registrava dados históricos. As nações ao redor transmitiam suas histórias desta maneira, já Israel registrava sua história através dos atos de relacionamentos do povo com Seu Deus.
As histórias contavam os pecados, acertos, erros, atitudes e as implicações dos mesmos na Aliança de Deus com eles. Peterson chega afirmar que os Israelitas foram os primeiros a contar a história de seu povo, através de seu relacionamento com Seu Deus.
Isso comprova a tese da importância deste livro na teologia pastoral, uma vez que, não importa se você é uma pessoa ilustríssima, ou uma pessoa “não significante”. Nos Planos de Deus não existem diferenças. E cabe aos pastores direcionar as pessoas de sua congregação a cumprirem o plano de sua existência.
O Conto
O autor revela o que o conto dos hebreus tem como essência na seguinte expressão:
Um povo aprendeu a entender sua vida historicamente, ou seja, como uma existência harmoniosa e significativa, em que a vontade de Deus se mesclava com o livre-arbítrio das pessoas em que condições que apontavam para um propósito. (página 81)
O povo hebreu não tinha a intenção de fantasiar seus contos. Não tentavam ilustrar apenas uma distração, ou seja, seus contos não eram como os contos de outros povos, como por exemplo, o conto das mil e uma noites. Seus contos eram narrados a partir de seus relacionamentos pessoais com Deus, consigo mesmo e com seu próximo.
O papel do ministro é levar suas ovelhas a escreverem seus próprios contos dentro destes relacionamentos citados acima. Peterson pega as histórias de Noemi e Rute e faz um paralelo com as pessoas que todos os domingos estão sendo ministradas por nós ministros do Senhor.
Noemi pensava ter sido amaldiçoada por Deus (Rute 1:21). Rute que não era judia era moabita. Pensava não ter participação dentro da grande epopéia dirigida pelo Eterno. Suas vidas de uma forma harmônica revelaram o grande conto de Deus.
Peterson faz um paralelo maravilhoso com a realidade local da paróquia. Ele diz o seguinte:
Os obscuros, aqueles em que ninguém repara, os levados pela correnteza, amargurados, que foram sistematicamente rejeitados pela sociedade, ouvem a história mais ampla sem perceber que lugar ocupam dentro dela: não enxergam onde se encaixam. (página 82)
O coração pastoral deve dirigir sua paróquia a experimentar contar sua história dentro da perspectiva da visão de Deus. Nós ministros podemos incorrer em dois erros ao realizarmos essa tarefa segundo o autor:
Moralismo – O pastor que evoca somente o que está de errado na vida da pessoa acaba causado na mesma o sentimento ainda maior de sectarismo em relação ao plano da salvação.
O pastor deve assim como um médico ao dar um laudo, analisar o histórico pessoal do indivíduo. Ao analisar a história da pessoa, o pastor conhecerá os dramas pessoais, penúrias, sofrimentos e tantos outros aspectos, que são partes do plano de Deus para vida específica daquela pessoa e de como esta história toma forma dentro da cosmovisão do Sinai.
Condescendência – De forma geral estamos caminhando em uma linha tênue dentro deste erro. A nossa dificuldade em lidarmos com as pessoas maçantes, aqueles que não dizimam os que não lêem a Bíblia e não oram aqueles que são obstinados a contrariarem as orientações expressas transmitidas por nós. Peterson chega a afirmar que estas pessoas são “veneno da vida pastoral”.
Se a cosmovisão pastoral não evocar cada pessoa apenas como parte de uma mera estatística, como mais um que se divorcia como ilustrações para seus sermões de desânimo, falta de apetite de Deus e etc. Se focamos em contar histórias a partir da vida de cada individuo. Sem desprezarmos os detalhes que compõe a sua vida e de como o Senhor age em meio a estes detalhes.
O autor de uma forma peculiar fala acerca da importância do ouvir de um pastor. Quando o pastor se presta a ouvir o que sua ovelha está a lhe contar, ele a ajudará a dar forma, aquilo que aparentemente não tem forma, ele ajudará a montar o quebra cabeças. Ajudará sua ovelha a entender melhor sua história do ponto de vista do Sinai.
Fechando esta parte do livro gostaria de encerrar com as palavras do próprio Peterson que diz:
O pastor inicia, assim, o seu trabalho, não necessariamente contando uma história, mas acreditando que há uma a ser contada, prestando atenção à vida do outro se dispondo a ouvir inclusive as digressões aparentemente incoerentes, até que o enredo comece a emergir. (página 87)
Aconselhamento e Visitação
O autor inicia esta etapa afirmando que a maior contribuição do pastor na criação de histórias é ouvindo. Peterson diferencia o aconselhamento da visitação apenas pelo fato das circunstâncias onde o mesmo será realizado. No caso do aconselhamento geralmente é realizado na Igreja onde o pastor tem o controle da situação, pois encontra em seu habitat se assim podemos dizer.
No caso da visitação, a pessoa que é beneficiada geralmente tem o domínio da situação, geralmente pelo fato do mesmo ocorrer em seu habitat natural. Assim se torna fácil para nós entendermos o porquê dos pastores preferirem aconselhar e os membros privilegiarem a visitação. De alguma forma também o ato da visitação pastoral faz o membro sentir-se querido e importante para o pastor.
A função pastoral dentro do aconselhamento e da visitação é levar sua ovelha a descobrir onde ela se encaixa no enredo da aliança de Deus. Peterson novamente é muito feliz ao fazer o link do livro de Rute ao assunto tratado. Ele expressa da seguinte maneira:
Quando vistos sob essa perspectiva, o aconselhamento e a visitação ao longo da semana são para o domingo o que o livro de Rute e para a Festa de Pentecostes, isto é, o que o conto é para história teológica. A construção de histórias recoloca tanto o aconselhamento quanto a visitação em seu cenário bíblico, do qual tem sido removidos nesta era de secularização. (página 89)
Segundo o autor, o aconselhamento e a visitação dentro do ensinamento bíblico exegético, vêm sendo substituídos pela psicologia e pelos fundamentos das relações públicas.
O pastor deve evitar ser mais um experts a ser consultado. A maioria das pessoas o enxergam assim, como uma pessoa superior que deve direcionar uma pessoa inferior. Sendo assim, se torna fácil para ela fugir da responsabilidade de viver com autenticidade sua própria vida.
Jesus refutou este pensamento enquanto tabernaculou entre nós. Quando o jovem rico o bajulou dizendo: “bom mestre”. Jesus o respondeu dizendo: “Porque me chamas bom”? Ninguém é bom, a não ser um, que é Deus. (Mc 10:18). Tudo nos leva a crer que aquele rapaz tentava bajular Jesus. Jesus o fez entender seu passado, apontou a ele o futuro em contraponto à Palavra de Deus e, aos olhos de uma visão secular, não teve sucesso, pois o jovem rico não o seguiu.
O interesse primordial desta prática é levar o aconselhado a construir sua história dentro dos padrões do Sinai. Paulo demonstra que ele não era diferente das pessoas que o cercavam se utilizando de termos como: “concidadão, co-herdeiro, conservo e etc.”. Na epístola aos coríntios ele chega a falar de seus medos, de suas fraquezas e de outras coisas que são inerentes a qualquer ser humano.
A função pastoral é criar uma ponte entre a pessoa e o Sinai. Ou seja, levar a mesma a entender sua parte no plano da salvação. Nem sempre teremos êxito, mas cabe a nos não deixar de fazê-lo.
Noemi, Rute e Boaz.
Os três personagens que compõe esta narrativa eram pessoas comuns que tinham histórias de vidas distintas, mas que se entrelaçavam no plano da salvação. Não cabe a nós designar papéis ou dirigir os mesmos, e sim, ajudar as pessoas a cumprirem seus papéis dentro que elas são aos olhos de Deus.
As reclamações e o vazio de Noemi são o palco para o Senhor revelar sua providência e cuidado. Noemi começa o livro sem nada. E encerra o livro preenchida e até mesmo sendo lembrada pelas mulheres da cidade que gritam que o filho é dela e não de Rute que era genitora. Através dos altos e baixos de sua vida, ela entende e experimenta a fidelidade de Deus.
Rute entra na história como a moabita, nora e viúva. Mas no decorrer da narrativa de sua história ela deixa de lado essa posição que lhe foi imposta e interfere fazendo um pedido a Boaz. Sua coragem em interferir no rumo da história faz dela não mais a moabita, nora, viúva, mas sim uma ancestral do Messias. Os caminhos de Deus às vezes devem ser descobertos, por métodos não tão tradicionais.
Já Boaz entra na história como um homem próspero, de boa reputação, um homem que tinha bons relacionamentos com as pessoas que o cercavam. Seu nome significa; “nele há força”. Sabemos do cenário em que se passa o livro de Rute. Boaz podia se esquivar e encaminhar o caso para um parente mais próximo, uma vez que o mesmo era vivo.
Boaz vai além de suas meras obrigações. Ele dispõe suas riquezas, sua vida a ajudar ao seu próximo. Peterson meio que nos dá a entender que cabe a nós, pastores, agirmos como Boaz. Disponibilizar às pessoas nossas vidas e bens em prol de que as mesmas experimentem o favor de Deus o Senhor.
Além destes personagens existiram outros, tais como, as mulheres que gritaram, o capataz da plantação, Orfa. A função pastoral é encaixar estas pessoas no plano de Deus uma vez que ele o conhece.
A Genealogia
O autor evoca nesta narrativa do texto a tamanha importância do término do livro de Rute. O Rev. Eugene Peterson narra da seguinte maneira:
A genealogia é uma ferramenta literária usada para fazer a transição de um exame microscópio da ação de Deus em um lugar específico, entre pessoas singulares, para uma visão telescopia do enorme alcance dos caminhos divinos. A genealogia faz isso sem chamar a atenção para si mesma e sem, de maneira alguma, diminuir a intensidade, a importância ou a integridade da história. (página 104)
As genealogias bíblicas revelam o cuidado de Deus em detalhar o plano da salvação através da vida de cada pessoa nela descrita. É demonstrar que pessoas que não tem nenhum valor aos olhos humanos são instrumentos da Graça aos olhos de Deus para demonstrar ao mundo seu plano de salvação.
O propósito da genealogia é demonstrar o alcance infinito dos caminhos de Deus em sua criação.
O papel pastoral é não se limitar há um nome, e sim fazer a pessoa entender sua árvore genealógica e sua parte no enredo da salvação. Afinal de contas, todos fazemos parte da história do Ator principal que é o Alfa e o Omega, o Início e o Fim.
Deus se utiliza da história de cada um de nós para a construção de seu Majestoso plano de salvação. O pastorado leva as pessoas enxergarem seus papéis, na construção de sua história e com isso, trazem-nas para próximo do púlpito, também a participarem de ordenanças como o Batismo e a Ceia do Senhor.
Que significa isso?
O papel do pastor durante muito tempo foi entendido “como preparar as pessoas para uma boa morte”. O pior deste entendimento não é a cosmovisão da morte, e sim, da vida. Quando os pastores conseguem levar as pessoas a entenderem suas histórias de vidas, elas deixam de viver por viver, e passam a existir literalmente para Glória de Deus.
No relato de Atos 2, o Pentecostes reuniu o maravilhoso e o comum. Neste relato, literalmente, foi colocado lado a lado o livro de Rute e o Sinai. Este evento marcado pela descida do Espírito Santo foi ao mesmo tempo esplêndido e grandioso, como também íntimo e pessoal. Peterson termina este capítulo com o seguinte parágrafo:
Quando as maravilhas de Deus (tema do Pentecostes) foram contadas “em nossas próprias línguas” (estilo de Rute), a igreja veio à existência, uma comunidade de fé onde a “velha história” encontrou nova expressão nas novas histórias de obediência, confiança, amor e benção. Afinal de contas, “ouvir uma história não significa vivê-la também?”. (página 109)
Conclusão
O entusiasmo que este livro causou em nós, nos fez entender que desde já, devemos ter o cuidado pastoral ao conduzir cada pessoa a compreender sua história, e como a mesma se encaixa no plano da salvação.
Indicamos o livro sem alguma ressalva, ou sem quaisquer medos de que possa fazer algum mal a qualquer que se disponha a degustá-lo.
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