segunda-feira, 22 de outubro de 2012

João Calvino o Sistematizador


Capítulo XIV – João Calvino o sistematizador.
“Cuidemos que nossas palavras e pensamentos não voem além do que a Palavra de Deus nos diz. (...) Deixemos com Deus o seu próprio conhecimento, (...) e prossigamos tal como Ele se nos der a conhecer, sem tratar de descobrir algo sobre sua natureza fora da sua Palavra.”
(João Calvino)


1.1.  INTRODUÇÃO:
Para a maioria dos estudiosos da história da igreja; João Calvino foi o mais importante sistematizador entre aqueles que encabeçaram o movimento reformado. Enquanto Lutero foi o homem responsável por incendiar o movimento através do fogo que ardia em seu coração pela salvação em Cristo Jesus. Calvino foi à cabeça pensante do movimento, no que tange a dar ao mesmo, forma e corpo.
Lutero devido a sua angústia e luta contra o pecado e pela seu histórico em relação a sua cosmovisão acerca da pessoa de Deus Pai. Denotou muito de seu tempo, estudo e esforços para esclarecimento da doutrina da justificação e salvação. Porém, Calvino se prendeu somente a estes temas. O reformador de Genebra conseguiu ampliar o seu horizonte e sistematizou muito daquilo que o próprio Lutero já havia publicado em seus textos, como também os outros reformadores, Zuínglio, Melancton, etc.

1.2.  BREVE BIOGRAFIA DE CALVINO
João Calvino nasceu em 10 de julho de 1509, na França, mas especificamente na cidade de Noyon. Nesta data, o nosso monge (Martinho Lutero) já havia realizado suas primeiras conferências na cidade de Winttenberg. Calvino era oriundo de uma família de classe média. Seu pai trabalhava como secretário do bispo e procurador da biblioteca da catedral. Foi através dos contatos de seu pai que João teve a oportunidade ter seus estudos custeados.
Foi estudar em Paris onde se deparou com a forte ênfase do humanismo clássico e também contra as suas oposições. Foi lá que tomou conhecimento das doutrinas e pensamentos de Wyclif, Huss e Lutero. Porém, em seus escritos pessoais, o mesmo relata que sua mente estava ainda totalmente escrava do papado.
Em 1529, João encerrou os seus estudos em Paris, tendo já nessa época se tornado Mestre em Artes. Foi então que decidiu dedicar-se a jurisprudência. Afim de se aprimorar foi estudar em Orleans e em Bourges, sob a tutela dos dois mais famosos juristas da época: Pierre de I’Estoile e Andrea Alciati.
Pierre seguia os métodos tradicionais no estudo da interpretação das leis, enquanto o segundo era um extremo defensor do humanismo. Em um determinado dia, os dois se reuniram para um debate de suas ideias e pensamentos. Como mediado estava jovem Calvino. O reformador tomou partido de Pierre e desde já demonstrava a ênfase que iria perseguir durante sua carreira acadêmica.
Após este debate, Calvino se uniu a um grupo de humanista para estudar e se aprimorar em seus estudos. Em 1530, receberá a licença para advogar, mas mesmo assim se dedicava a preparação de um comentário sobre a obra de Sêneca, De Clementia. Em 1532, seu comentário sobre a obra foi publicado. Sua obra fora bem recebida, mas não ocupou o lugar de destaque entre os mais ilustres humanistas.
1.3.  A CONVERSÃO
Diferentemente de Lutero – Calvino nos fala muito pouco sobre sua os temores de sua alma anteriormente a sua decisão de largar a igreja romana e seguir o protestantismo que estava fervilhando por muitas partes da Europa.
Os historiadores e estudiosos acreditam que sua conversão se deu ao fato de seu aprofundamento no estudo das Escrituras Sagradas. Que por sua vez causaram imenso contraste com o pensamento humanista em que o próprio João Calvino estava submerso. Acredita-se que as Escrituras o conduziram a convencer-se de seus pecados e necessidade de colocar sua fé em Cristo, encontrando então, a doutrina celebre da justificação pela fé.



1.4.  AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÃ
Nosso célebre pensador desde sua decisão sentiu-se compelido pelo Senhor em dedicar sua vida em aprofundar-se nas doutrinas Bíblicas para produzir tratados teológicos que de fato viessem a clarificar a fé de todo aquele que encontrasse em Cristo a salvação para sua vida.
Logo após ter deixado de lado o sustento que seu pai recebia da igreja romana. Começou a ser perseguido por Francisco I, e se refugiou em uma cidade chamada Basileia. Nesta cidade escreveu seu primeiro tratado teológico acerca do estado da alma após a morte. Quando pode contemplar sua primeira obra completa. Sentiu-se desafiado por Deus a continuar produzindo para a edificação do Reino de Deus.
Mesmo tendo claro em sua mente a convicção de seu chamado para realização de tal feito. João Calvino nunca se imaginou sendo um dos grandes nomes que encabeçariam a reforma protestante.
Calvino começou a escrever seus tratados tendo em mente que os mesmos seriam esboços iniciais para clarificar a fé. Haja vista que a maioria dos escritos existentes tinham cunhos apologistas e não buscavam sistematizar a fé buscando a otimização do aprendizado de cada crente em Cristo Jesus. A esse breve manual da fé ele deu o nome de Institutas da Religião Cristã.
A primeira edição surgiu em Basiléia, no ano de 1536, um livro de 516 páginas. Seu formato visava dar aos seus donos a possiblidade de carrega-lo para toda e qualquer parte. Os bolsos das calças eram grandes e largos e possibilitavam tal coisa. Seu conteúdo se dividia em 6 capítulos. Os primeiros quatro capítulos tratavam sobre a lei, o Credo, o Pai Nosso e os Sacramentos. Os últimos dois capítulos trataram de temas polêmicos. Tratavam de resumo da posição cristã protestante acerca dos Sacramentos e sobre a liberdade cristã.
A obra foi um verdadeiro sucesso! Devido ao fato da mesma ter sido escrita em Latim facilitou para que outras pessoas de nacionalidades pudessem ter acesso e entendimento da mesma. Após esta publicação Calvino se empenhou em continuar a escrever acerca da fé cristã.
Calvino tinha em mente em escrever esboços simples sobre a fé cristã. Porém a obra tomou uma grande proporção. O manual inicial com 516 páginas deu lugar a um compêndio de 4 obras, sendo o somatório de capítulos de 80.
            González em seu livro tece o seguinte comentário sobre essa questão:
“Esse texto definitivo dista muito de ser o pequeno manual de doutrina que Calvino tinha tido em mente publicar quando da primeira edição, pois os seis capítulos de 1536 haviam se tornado em quatro livros com um total de 80 capítulos. O primeiro livro trata sobre Deus e sua revelação, assim como da criação e da natureza do ser humano, porém sem incluir a queda e a salvação. O segundo livro trata sobre Deus como redentor e o modo em que se nos dá a conhecer primeiramente no Antigo Testamento, e depois sem Jesus Cristo. O terceiro livro trata sobre como, pelo Espírito, podemos participar da graça de Jesus Cristo e dos frutos que ele produz. Por último, o quarto livro, trata dos “meios externos” para essa participação, isto é, fala-nos sobre a igreja e os sacramentos. Por toda obra se manifesta um conhecimento profundo, não só das Escrituras, mas também de antigos escritores cristãos, particularmente Santo Agostinho, e as controvérsias teológicas do século XVI. Sem dúvida alguma, esta foi a obra-prima de teologia sistemática protestante em todo o século.”[1]


1.5.  CONTRIBUIÇÃO TEOLÓGICA
1.5.1.      O DEUS TRINO
A semelhança de Lutero e Zuínglio, em seus primeiros tratados Calvino não se empenhou em formular novas concepções teológicas acerca da Trindade. Como, seus colegas reformadores, apenas repetiu as formulações dos pais apostólicos e dos concílios que trataram acerca deste assunto.
Porém, por Calvino não ter dado ênfase no assunto. Um homem chamado Pierre Caroli o acusou de Arianista. Nosso célebre reformador teve muita dificuldade em desmentir a mentira diabólica proferida a seu respeito. Foi por este motivo que Calvino se debruçou em defender sua compreensão ortodoxa acerca da Trindade. Vejamos suas colocações acerca da mesma:
“Quando professamos crer em um só e único Deus, pelo termo Deus entende-se uma essência única e simples, em que compreendemos três pessoas ou hipóstases...”[1]
Calvino se utilizou das expressão “essência, persona, trindade, hipóstases” devido ao herege Ário ter se utilizado de nomenclaturas bíblicas para urrar suas heresias contra a santíssima Trindade. Foi por este motivo que Calvino se utilizou de nomes que não se encontravam na Bíblia, para de forma clara se posicionar contra as heresias deste pervertido teológico ao qual fora dito crer em suas doutrinas.
O propósito do Trinitarismo de Calvino, como o de Atanázio, era soteriológico. Ele queria afirmar de forma categórica a doutrina da encarnação de Cristo de forma corpórea, cumprindo e satisfazendo a justiça de Deus em sua missão terrena. Seus pressupostos Bíblicos para afirmação da doutrina da Trindade se deram na manifestação da Trindade no Batismo de Jesus e também nas doxologias Paulinas.
O mestre Calvino tinha muita dificuldade em argumentar a doutrina da trindade tendo como pressuposto argumentos tais como: o nome em hebraico que a pessoa de Deus as vezes é apresentado no Antigo Testamento , a tríplice manifestação de louvor dos serafins, as afirmações de Jesus “eu e o Pai somos um” (Jo 10.30). Ele as considerava provas refutáveis.

1.5.2.      A CRIAÇÃO
Calvino se remetia a criação como “o teatro da Glória de Deus”. Ele enxergava em todo o mundo criado uma forma de Deus testemunhando o seu poder e divindade aos seres humanos. Porém ele não acreditava que a revelação de Deus na natureza era suficiente para levar ao homem a salvação.
Ele cria que o homem ao olhar para natureza, ser iluminado pelo Espírito, e orientado pelas Escrituras encontram em Cristo salvação para suas vidas. Ou seja, Calvino não cria em uma teologia natural, mas sim em uma teologia da natureza.

1.5.3.      A PROVIDÊNCIA
Nenhum outro homem de seu tempo foi tão taxativo quanto Calvino ao tratar acerca da fragilidade humana. Lutero conviveu com uma latente culpa. Zuínglio por sua teve uma compreensão mais profunda do evangelho devido ter se livrado da morte. João Calvino tinha um profundo conflito acerca da falta de sentido da existência humana.
Em seus escritos tratou sobre como o ser humano está a mercê dos males da matéria. Como um homem pode ser afligido por diversas enfermidades; como pode cair de um cavalo durante o seu cavalgar; como pode ao passar próximo a uma casa ser atingido por uma telha solta; como pode ter um incêndio provocado em sua casa, etc.
Essa cosmovisão em os nossos dias ganhou o nome de existencialismo moderno. Ao descrevermos esse fato parece-nos demonstrar que o nosso célebre reformador é um homem cético, que não crê em um Deus pessoal, criador e sustentador de todas as coisas. Pelo contrário, por Calvino ter entrado nesta crise, a mesma a levou a construir o seu pensamento acerca da providência divina.
Sua cosmovisão se diferenciou de duas cosmovisões que eram muito comuns em seu hodierno: o fatalismo e o deísmo. O fatalismo clássico é um sistema de causa e efeito. Onde os fatos acontecidos se tornam irrevogáveis, onde nenhum ser pode mudar o curso do que está determinado acontecer. Às vezes é muito confundido com o determinismo.
Já o deísmo, era uma crença de que Deus criou o universo e o entregou o mesmo a mercê de sua própria ordem natural. Sendo assim, Ele, Deus, é um ser distante, impessoal e incapaz de exercer alguma influência sobre a criação ou a humanidade.
Para Calvino a doutrina da providência estava diretamente ligada à doutrina da criação. Da mesma forma que o Senhor Deus criou todas as coisas e este fenômeno fora algo grandioso e deixa aquele a quem crer estupefato. Esse Deus é o que minuciosamente cuida dos mínimos detalhes desta criação.
Calvino acredita tanto na providência de Deus, que o mesmo se utiliza do exemplo de Satanás para exemplificar o tamanho do cuidado de Deus para com os seus. O Diabo que veio somente para roubar matar e destruir. Muitas vezes é utilizado como ferramenta de Deus para abençoar os seus Eleitos, promovendo assim a Soberania Divina da Providência.
Alguns críticos da doutrina de Calvino argumentavam que se Deus decreta cada evento, o ser humano é totalmente irresponsável por suas ações. Calvino contra argumentava dizendo que é lógico que o ser humano é responsável por suas ações. E, por este motivo, o Senhor nosso Deus nos cerca de cuidados e ferramentas para a manutenção de nossa proteção. Porém, o ser humano não é uma madeira ou até mesmo um objeto qualquer. E, por assim ser, Deus o conhece e o usa como criatura racional, cada um dentro de sua perspectiva.
Calvino em seus escritos também trata da vontade oculta de Deus e sua vontade revelada. A vontade revelada de Deus é a sua Palavra que nos mostra de modo muito claro os seus mandamentos. Como por exemplo: não matarás. Porém, a vontade oculta de Deus é manifesta também da mesma forma. Por exemplo: A Bíblia diz que Herodes e Pilatos estavam cumprindo o que Deus anteriormente havia sido decretado que haveria de ser feito. (At. 4.27-28) Na verdade não nos parece que Deus estava contrariando-se a si mesmo. Ele que havia determinado que não poderíamos matar, estava determinando a morte de Jesus.
Porém, é um erro pensar desta forma de causa e efeito quando se trata da pessoa de Deus e seu modo de agir. A nossa limitação humana não nos permite alcançar e nem ao menos entender os desígnios e pensamentos divinos. Sendo assim, cabe-nos apenas nos submeter a sua vontade e firmarmos nossa fé em seu caráter imutável.
Não podemos falar da providência na cosmovisão de Calvino sem falar sobre como o mesmo aplicava a mesma a sua vida pastoral diária. João ao se deparar com situações de enfermidades, dores, perdas, etc. Estimulava os fiéis a olharem e a encontrarem no Cristo alguém que a nossa semelhança sofreu como nós e nos entende de modo pleno e por este motivo pode se compadecer de nós. E também, sempre se remetia ao fator Eternidade. Tendo como pressuposto as palavras de Paulo acerca do tabernáculo deste tempo.
           





[1] GEORGE, Thimoty. Teologia dos Reformadores. São Paulo: Vida Nova. 1993. 199pg.



[1] GONZALEZ, Justo L. A era dos reformadores. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pg.111.

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