Projeto – “De bem com a Bíblia” – Março de 2024
Professor – Roberto da Silva Meireles Rodrigues
Livro – Gálatas.
2º AULA – AUTORIDADE DO APOSTOLADO DE PAULO E SEU EVANGELHO – Gl 1.1-5
“Paulo, apóstolo – não da parte de pessoas, nem por meio de homem algum, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai, que o ressuscitou dos mortos -, e todos os irmãos que estão comigo, às igrejas da Gálacia. Que a graça e a paz de estejam com vocês, da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo, o qual entregou a si mesmo pelos nossos pecados, para nos livrar deste mundo perverso, segundo a vontade de Deus e Pai, a quem seja a glória para todo sempre. Amém!” (Galátas 1.1-5)
VERSO 1 e 2
– “Paulo, apóstolo – não da parte de
pessoas, nem por meio de homem algum, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai, que
o ressuscitou dos morto -, e todos os irmãos que estão comigo, às igrejas da
Gálacia.”
A maioria das epístolas que escritas
por Paulo tecia elogios e costumeiramente era gentil em suas palavras
introdutórias. Todavia, ao escrever aos Gálatas ele parece estar focado
unicamente em resolver os problemas doutrinários identificados. Problemas estes
que geram no apóstolo um mix de sentimentos e uma insatisfação “santa” que é
nitidamente percebida em suas palavras.
Donald Guthrie comenta sobre esta
questão: “Embora todas as saudações
iniciais nas Espistolas de Paulo tenham certos aspectos em comum, cada uma
possui características próprias, e esta Epístola tem um aspecto que a destaca
nitidamente das demais. É mais abrupta e omite o aspecto usual do louvor aos
leitores, refletindo imediatamente o estado de ânimo do escritor. Ele não se
monstra inclinado a enfatizar qualquer sentimento de afeto por este grupo de
cristãos, porque um propósito mais urgente está à sua frente. Deve ter ficado profundamente
sentido com a falha destas pessoas em ficar à altura das suas expectativas,
porque em todas as demais Epístolas usa o encorajamento no início, mesmo quando
mais tarde pass a críticas.”[1]
“Já no primeiro
parágrafo de sua carta aos gálatas, Paulo menciona dois temas aos quais ele irá
retornar constantemente: seu apostolado e o seu evangelho. No mundo antigo
todas as cartas começavam com o nome do autor, seguindo-se o nome do
destinatário e uma saudação ou mensagem. Nesta epístola aos Gálatas, no entanto,
Paulo se estende mais do que era de costume naquele tempo e mais do que
costumava fazer em suas outras cartasd, tanto na apresentação de suas
credenciais como autor quanto na saudação. Ele tinha bons motivos para fazê-lo...
Paulo percebe claramente os perigos desse duplo ataque, e por isso lança, bem
no começo da Epístola, uma declaração de sua autoridade apostólica e do seu
evangelho da graça. Mais adiante ele irá desenvolver estes temas; observe,
porém, como ele começa: Paulo, apóstolo (não um impostor)... Graça a vós. Estes
dois termos, “apóstolo” e “graça”, eram palavras muito significativas nessa
situação e, se nós a entendermos corretamente, captaremos os dois assuntos
principais da Epístola aos Gálatas.”[2]
“Paulo,
apóstolo...”
– Como seu chamado está sendo questionado e
junto com sua autoridade o seu ensino. Paulo ratifica o fato de que seu chamado
não era meramente para seu uma espécie de enviado como o termo “apóstolos” é
também comumente usado no Novo Testamento. O apóstolo está reenvindicado para
si um chamado especial. Semelhante ao chamado dos doze discípulos feito
diretamente pelo Senhor Jesus. Ele também possui um chamado feito pelo próprio
Senhor Jesus na estrada de Damasco atribuindo ao mesmo o mesmo ofício dado aos
doze para anunciar ao evangelho e lançar os fundamentos doutrinários da igreja
que estava em seu nascedouro.
O estudioso do Novo Testamento, Adolf Pohl, em seu
comentário sobre o verso faz uma observação importante dizendo que: “No Cristianismo primitivo também havia
“apóstolos das igrejas” (2Co 8.23 cf bj), que como tais realmente eram pessoas
respeitadas (cf Gl 2.12). Contudo Paulo não se insere nessa fileira. Ele não é
o expoente de um grupo de cristãos, p.ex., da igreja de Jerusalém. A partir do
v 16 ele o comprovará. Ele tampouco foi incumbido de sua mensagem por intermédio de homem algum, p.ex.,
por Pedro. No v 18 ele especificará o seu relacionamento com Pedro.”[3]
“...
não da parte de pessoas, nem por meio de homem algum...” – O
apóstolo deseja enfatizar a origem de sua vocação; deseja expôr seu argumento
defendo a autoridade de seu apostolado que não é oriundo de pessoas. Ele
enfatiza bem essa questão negando ao longo do capítulo mais quatro vezes que
seu chamado não provém de homens. Adolf Pohl comenta essa questão: “Nos v 10ss Paulo ainda acrescenta nada mais
nada menos que quatro negações do ser humano: Não para aprovação das pessoas (v
10ª), não para agradar as pessoas (v 10b), não segundo a maneira humana (v 11)
e não recebido nem aprendido de seres humanos (v 12). Por que nesse assunto o
ser humano é tão nitidamente escluído? Por causa do ser humano, para que lhe
seja preservado o evangelho de Deus. A pregação de Paulo não constituiu nenhum
acontecimento interativo entre pessoas. Nela o ser humano não tem a ver consigo
próprio, não telefona consigo mesmo, não se ergue pessoalmente do pântano pelos
cabelos.”
Muitos estudiosos
comentam que a expressão “... nem por meio de homem algum...” pode designar
duas possibilidades. A primeira era o questionamento realizado pelos falsos
mestres de que Paulo não era discípulo direto de nenhum dos doze apóstolos e
por essa questão não possuia uma espécie de linhagem apostólica. A segunda
possibilidade levantada pelos estudiosos era uma ligação de Paulo com Ananias
no momento da imposição de mãos dele. O fato é que seja qual for o
questionamento levantado pelos falsos mestres, o apóstolo deixa bem claro que a
origem de seu chamado, de sua vocação, era do próprio Jesus ressurreto. Assim
como fora no comissionamento dos doze.
“...
mas por Jesus Cristo e por Deus Pai, que o ressuscitou dos mortos...” – Após
negar de forma veemente a ligação de seu apostolado a homens, o apóstolo faz
uma afirmação categórica da origem de seu chamado ser oriunda da pessoa do
próprio Senhor Jesus Cristo. O link de seu apostolado é a mesma dos demais doze
apóstolos. Paulo, também enfatiza a legitimidade do próprio Jesus pelo fato do
mesmo ter sido oriundo do próprio Deus, ou seja possuir a mesma substância e
que Deus aprovou o sacrifício de Jesus o ressuscitando dentre os mortos que é o
alicerce de toda construção da fé cristã. Pois, como diz o próprio apóstolo
Paulo escrevendo aos crentes de Coríntios: “Ora,
se o que se prega é que Cristo ressuscitou dentre os mortos, como alguns de
vocês afirmam que não há ressurreição de mortos? E, se não há ressurreição de
mortos, então Cristo não ressuscitou. E, se Cristo não ressuscitou, é vã a
nossa pregação, e é vã a fé que vocês têm.” (1Co 15.12-14)
“O
“apostolado” de Paulo, como ele explicará adiante no capítulo, é o resultado do
seu próprio encontro pessoal com o Jesus ressuscitado e do chamado consequente
do Deus único para ser uma testemunha credenciada. Portanto, sua condição “não
provém de fontes humanas”. Paulo também não aprendeu os rudimentos da mensagem
de qualquer outras pessoa: seu apostolado não “veio por meio de um ser humano”,
como novamente ele explicará no momento adequado. Em vez disso, do mesmo que em
Romanos 1:3-4, Paulo define a si mesmo e sua obra nos termos do próprio
evangelho: seu chamado vio “de Jesus, o Messias, e de Deus, o Pai, que o
ressuscitou dentre os mortos”. A ressurreição quase não faz parte do argumento
posterior de Gálatas, mas, do mesmo modo que o alicerce sólido de uma casa bem
construída, é importante (por exemplo, em 2:19-20 e na promessa culminante da
“nova criação”, em 6:15), ainda que esteja praticamente invisível. Para Paulo,
a ressurreição do Jesus crucificado, que é realizada por Deus – que, de outro
modo, seria tido como um “falso messias” que desviou Israel -, se constituía na
base de tudo o mais que ele ensinava e vivia, bem cono no que ele cria.”[4]
“...
e todos os irmãos que estão comigo, às igrejas da Gálacia.” – O
apóstolo faz questão de citar os irmãos que são seus companheiros em suas suas
empreitadas missionárias. A citação não dá direito para que estes sejam também
autores da carta. A obra pertence exclusivamente a Paulo. Logo após, ele cita
os destinatários da carta. Não entraremos nos pormenores desta questão, pois
essa questão fora debatida na primeira aula na intrudução do estudo a epístola.
VERSOS DE 3 Á 5 – “Que a graça e a paz
estejam com vocês, da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo, o
qual entregou a si mesmo pelos nossos pecados, para nos livrar deste mundo
perverso, segundo a vontade de Deus e Pai, a quem seja a glória para todo
sempre. Amém!”
“Que a graça e a paz estejam
com vocês...” – Mesmo estando descontente e
exortando-os, o apóstolo continua considerando os cristãos das igrejas da
Galácia como seus irmãos. Sendo assim, o apóstolo os saúda como costumeiramente
ele o faz em pelo menos 10 de suas Epístolas e como era de costume no mundo
antigo. Todavia, a saudação carrega um profundo significado teológico. Dr. John
Stott comenta: “... Não são termos
formais e sem sentido. “Graça” e “paz”, embora sejam palavras comuns, estão
empregnadas de conteúdo teológico Na verdade, elas resumem o evangelho da
salvação pregado por Paulo. A natureza da salvação é a paz, ou reconciliação:
paz com Deus, paz com os homens, paz interior. A fonte da salvação é a graça, o
favor livre de Deus, independente de qualquer mérito ou obras humanas, sua
benevolência para com os que não merecem. E esta graça e paz flui tanto do Pai
quanto do Filho. Paulo passa imediatamente ao grande evento histórico no qual a
graça de Deus foi exibida e do qual deriva a Sua paz, isto é, a morte de Jesus
Cristo na cruz: o qual se entregou a si mesmo pelos nossos pecados, para nos
desarraigar deste mundo perverso, segundo a vontade de nosso Deus e Pai (verso
4). Embora Paulo tenha declarado antes que Deus Pai rescussitou Cristo dos
mortos (versículo 1), agora ele escreve que é através da sua entrega para
morrer na cruz que Jesus nos salva. Consideremos o rico ensinamento que temos
aqui acerca da morte de Cristo.”[5]
Após ter feito essas considerações Stott cita os seguintes ensinamentos
realizados por Paulo nestes versos acerca da morte de Cristo: a) Cristo morreu
por nossos pecados; b) Cristo morreu para nos libertar deste mundo; c) Cristo
morreu de acordo com a vontade de Deus.
“...
da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo,o qual entregou a si
mesmo pelos nossos pecados para nos livrar deste mundo perverso, segundo a
vontade de Deus e Pai...”
– Cristo morreu pelos nossso pecados. O
apóstolo Paulo é meticuloso no uso das palavras. Donald Guthrie comenta: “A combinação do Senhor (kurios) com Cristo
(Christos = Messias) é significativa por expressar o cumprimento das mais altas
esperanças tanto dos gentios quanto dos judeus. O título inteiro tinha,
portanto, profundo significado.”[6]
O conceituado estudioso
do Novo Testamento Dr. Ladd em sua “Teologia do Novo Testamento” pontua o fato
de Paulo não utilizar muito o termo “messias” para se referir a Jesus pela
questão de a maioria de suas cartas possuir como destinatários gentios. Porém,
o que não significa que Paulo não dá creditava muito valor a esta doutrina,
muito pelo contrário, ele tinha total consciência de que Jesus era o Messsias e
foi por este conceito tão entranhado de sua cultura judaíca que ao ter um
encontro com Jesus na estada de Damasco percebeu que Jesus era o Messias
prometido pelos profetas.
“Paulo
fala pouco tanto sobre o Reino de Deus quanto do messianato de Jesus, porém
ambos são doutrinas fundamentais em seu pensamento. Provavelmente, a razão
disso seja devido ao fato das cartas de Paulo serem dirigidas à audiência dos
gentios, em vez dos judeus. Se tivéssemos uma correspondência de Paulo dirigida
aos judeus, provavelmente encontraríamos muito mais a respeito do messianato de
Jesus e de seu Reino. Devemos recordar que esses assuntos eram extremamente mal
interpretados. Proclmar qualquer rei que não fosse César era algo passível de
condenação, ou seja, essa pessoa seria condenada à pena de sedição (At
17:3,7).”[7]
Ladd também vai enfatizar a palavra
“kyrios” que em Paulo toma conotações de uma espécie de confissão de fé, um
credo. Haja vista que Paulo vai dizer: “E ninguém pode dizer que Jesus é o
Senhor, senão pelo Espírito Santo” (1Co 12:3). O estudioso vai explicar que não
impossível uma pessoa falar sem ter o real entendimento. Todavia, aquele que
confessa essa verdade com siceridade de coração, o faz movido pelo Espírito
Santo. Isso se torna a marca de um verdadeiro cristão, a confissão de que Jesus
Cristo é o Senhor.
“Confessar
que Jesus é o Senhor não é simplesmente uma expressão de devoção pessoal, pois
essa devoção pessoal está, em si mesma, baseada em um fato mais importante: a
autoridade cósima de Jesus. No ato da confissão, aquele que O confessa não
apenas reconhece uma nova relação pessoal com Cristo, também afirma um artigo
de fé, a saber, que, por sua morte e ressurreição, Jesus foi elevado a um lugar
de soberania sobre todos os seres humanos, tanto os vivos como os mortos (Rm
14:9). Só confessamos que Jesus é o Senhor, porque Jesus foi de fato glorificado
e é o Senhor exaltado acima de todos os outros deuses e senhores, quer reais,
quer imaginários (1Co 8:5-6)... A importância do título Kyrios é encontrada no
fato de Kyrios ser a tradução grega do tetragrama YHWH, o nome de Deus na
aliança do Antigo Testamento. O Jesus exaltado ocupa o papel do próprio Deus no
governo do mundo. Deus está satisfeito em realizar, na pessoa de seu Filho
encarnado, Jesus Cristo, a restauração de um universo decaído. Quando o mundo
adora a Jesus Cristo como Senhor, está adorando a Deus.”[8]
“... o qual entregou a si
mesmo pelos nossos pecados...” – A esperança
apontada acima por Donald Guthrie reside no fato de Jesus ter nos livrado da
escrita de morte que nos aguardava. Com a queda no jardim do Éden o homem foi
impossibilitado pelo pecado de se relacionar com Deus e consecutivamente foi
expulso do Jardim. Agora com o homem já nascendo maculado pelo pecado e incapaz
de si mesmo livrar-se dessa condenação precisava da intervenção divina para se
ver livre das amarras que o prendiam. Não cabia ao Senhor somente perdoar os
pecados do homem, mas o Eterno precisava também que sua justiça fosse saciada,
uma vez que o homem pecou contra o Altíssimo violando uma ordem expressa. Gosto
da percepção de Anselmo teológo do sec XI com sua alegoria sobre a “satisfação”
da justiça de Deus. Alister McGrath vai explicar em sua obra “Teologia para
amadores” esse conceito de Anselmo: “Mas como pode a morte de Cristo de ter
esse efeito? Para analisar esse ponto, devemos olhar a resposta fornecida por
um teológo profissional – o teológo do século XI, Anselmo de Cantuária. Deus
criou a humanidade para que púdessemos ter a vida eterna, mas o pecado
infelizmente interveio para impedir que a obtivéssemos sem ajuda. Se é para
termos vida eterna, Deus terá que fazer algo a respeito. Deus não pode fazer de
conta que o pecado não existe, ou considerá-lo irrelevante. É uma força que
tratou de interromper tudo o que ele havia planejado na sua criação. Um remédio
que desfaça os efeitos do pecado, ainda que le seus aspectos morais a sério,
deve ser encontrado. Anselmo deu ênfase ao pecado como problema moral. Ele não
pode ser simplesmente ignorado, mas deve ser confrontado. Então, como a ofensa
do pecado pode ser removida? Como pode o pecado ser perdoado justamente, de maneira
que abranja tanto a ofensa causada a Deus pelo pecado quanto seu generoso amor?
Ao responder essa questão, Anselmo formula uma analogia vinda dos tempos
feudais. Na vida comum, uma ofensa contra alguém pode ser perdoada desde que
algum tipo de compensação seja oferecido em contrapartida. Anselmo se refere a
essa compensação como uma “satisfação”. Vejamos, por exemplo, um homem que
rouba uma quantia de dinheiro. Para satisfazer as exigências da justiça, ele
teria de devolver o dinheiro além de uma quantia adicional pela ofensa do
roubo. Essa quantia adicional é a “satisfação”. Anselmo argumenta que o pecado
é uma ofensa séria contra Deus, ela exige uma satisfação. Como Deus é infinito,
essa satisfação deve ser também infinita. Mas por sermos finitos, não podemos
pagar por ela. Parece impossível, então, que tenhamos vida eterna. Mas esse não
é o fim da questão! Deus deseja que sejamos salvos – e salvos de maneira a
preservar tanto a misericórdia quanto a justiça dele. Embora nós, como seres
humanos pecadores, devêssemos pagar pela propriciação de nosso pecado, a
verdade é que não podemos. Simplesmente não temos os requisitos ou a habilidade
para quitar esse débito. Em contrapartida, ainda que Deus não tenha nenhuma
obrigação de pagar por isso, ela ainda ssim o faria, se quisesse. Então,
Anselmo assevera, fica claro que um Deus-homem seria, ao mesmo tempo, capaz e
obrigado a pagá-la. Assim, a morte de Jesus Cristo, como o Filho de Deus, é o
meio de resolver esse dilema. Como ser humano, Cristo tem a obrigação de
pagá-la; como Deus, ele tem a habilidade de pagá-la. A dívida, então, está paga
e nós podemos recuperar a vida eterna. A teoria de Anselmo mostra como a morte
de Cristo permite que Deus perdoe nossos pecados sem esquecer da sua justiça.”[9]
“...para
nos livrar deste mundo perverso, segundo a vontade de Deus e Pai...” – A
ideia utilizada pelo apóstolo é a mesma do ensino da libertação de Israel do
Egito registrada no livro do Êxodo. Era muito comum o ensino de que Jesus era o
nosso cordeiro Pascal, a nova Páscoa, o sacrifício da nova aliança de Deus com
os homens. Agora não somente para com Israel, mas para com toda a humanidade.
Havia um anseio pelo cumprimento das promessas de Deus da vinda do Messias e a
manifestação do Reino Messiânico. O momento em que esse Reino fosse estabelcido
o povo de Deus estaria livre de todos os tormentos deste tempo presente. A
teologia de Paulo é marcada por essa sentão entre as duas eras: “era presente”
e “era vindoura”. Os escritos do apóstolo nos fazem acreditar que ele acreditava
que a morte a ressurreição de Jesus haviam dado início ao advento da “era
vindoura” e que agora as duas eras conviviam de modo paralelo até que a “era
vindoura” seja totalmente estabelecida. O teológo N.T.Wright diz o seguinte: “Em outras palavras, a morte de Jesus “pelos
nossos pecados” – um tema central do evangelho em suas várias tradições
primitivas, como fica claro em 1Coríntios 15:3 – não tinha o objetivo de fazer
as pessoas “irem para o céu”, como em boa parte da tradição cristã posterior,
mas, sim, resgatar as pessoas dos poderes da escuridão que haviam escravizado o
mundo. Aqui deparamos com um sintoma de um problema recorrente na teologia
ocidental como um todo, o qual já foi observado na introdução. A maioria dos
cristãos ocidentais, quando é indagada sobre o motivo pelo qual Jesus morreu
por nossos pecados, responderia que foi “para que púdessemos ir para o céu”. No
entanto – de modo espantoso, pode-se pensar -, essa nunca foi a resposta do
Novo Testamento. Esperar que a “alma vá para o céu” depois da morte não é
característica de Paulo, nem dos outros cristãos do século 1, mas dos
platonistas do século 1, como, por exemplo, Plutarco. Porém, no Novo
Testamento, essa nunca é o propósito da ação redendora de Deus, pela boa razão
de que Deus quer resgatar a ordem criada, e não sequestrar pessoas dela e
depois abandoná-la. Com certeza, já que a própria morte se encontra entre os
poderes da escuridão da “presente era maligna”, então a “salvação” definitiva,
o resgate da morte, acaba entrando em pauta. Isso indicará a ressurreição do
corpo para participar do novo mundo de Deus. Paulo explica esse tema longamente
em 1Coríntios 15 e Romanos 8. Quando relacionamos algumas afirmações cristãs
iniciais sobre a morte de Jesus alcançou, percebemos que são impactantes. Nessa
passagem, o propósito da morte resgatadora de Jesus é para que os crisão possam
ser o povo da nova era de Deus, resgatados da presente era maligna. Em Gálatas
3:14, lemos que “assim foi para que a bênção de Abraão pudesse fluir por todas
as nações [...] e para que púdessemos receber a promessa do Espírito, por meio
da fé.” Em Apocalipse 5:9-10, a ação redentora de Deus em Jesus é alcançanda
para que os seres humanos resgatados possam formar “um reino e sacerdotes para
o nosso Deus”, que reinarão sobre a terra, e assim por diante. Como já afirmei
em outras obras, recebemos uma escatologi equivocada e, portanto, uma teologia
da expiação que induz ao erro. Não se trata de “ir para o céu”, mas da
inauguração da “era vindoura” de Deus aqui e agora, em meio ao caos da “presente
era maligna”. Havia uma moda na década de 1980 de um movimento que se
autodenominava “Nova Era”: mas essa moda parece ter passado. Entretanto, para Paulo,
a “nova era” não começou com uma configuração estranha de planetas e de símbolos
do zodíaco, mas quando Jesus de Nazaré saiu do túmulo, no início da manhã de Páscoa.”[10]
“...segundo
a vontade de Deus e Pai, a quem seja a glória para todo sempre. Amém!”- Como
anteriormente dito na citação da teoria de Anselmo, foi da vontade Deus
propiciar a humanidade um meio pelo qual ela pudesse novamente se reconciliar
consigo.
Paulo termina essa perícope expressando essa verdade
que deve ser entendida a luz das suas últimas palavras contidas nestes versos
iniciais. O Eterno fez tudo isso para sua glória. Ao entendermos que estávamos
perdidos ou como próprio Paulo diz “mortos” em nossos próprios pecados, ou
seja, impossibilitados de sairmos da situação ao qual estávamos e foi única e
exclusivamente pela graça e misericórdia de Deus que podemos experimentar uma
nova vida em Cristo Jesus, nosso Senhor.
A doxologia final deste verso de Paulo manifesta a
alegria do coração do cristão que encontrou a graça salvadora de Jesus que lhe
deu o diretiro de ser chamado filho de Deus. Essa salvação que não pode ser
alcançada por nenhum esforço, obra ou mérito humano. Mas sim, somente pela
graça mediante a fé em Cristo Jesus. O apósolo inicia a epístola trovejando
essa doutrina que é o cerne do evangelho e que estava sendo atacada por seus
opositores.
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Gálatas: comentário para a formação cristã. Rio de Janeiro: Thomas Nelson,
2023.
[1] GUTHRIE,
Donald. Introdução e comentário de Gálatas. São
Paulo, SP: Vida Nova, 1984.
[2]
STOTT, John R.W. A mensagem de
Gálatas: somente um caminho. São Paulo: ABU Editora, 2007, pg.14.
[3]
POHL, Adolf. Carta aos Gálatas:
Comentário Esperança. Curitiba, PR: Editora Evangélica Esperança, 1999, pg.34.
[4]
WRIGHT, N.T. Gálatas: comentário
para a formação cristã. Rio de Janeiro: Thomas Nelson, 2023, pg.73.
[5]
STOTT, John R.W. A mensagem de
Gálatas: somente um caminho. São Paulo: ABU Editora, 2007, pg. 18.
[6] GUTHRIE,
Donald. Introdução e comentário de Gálatas. São
Paulo, SP: Vida Nova, 1984, pg. 69.
[7] LADD,
George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São
Paulo: Hagnos, 2003, pg. 569.
[8] LADD, George Eldon. Teologia do Novo
Testamento. São Paulo: Hagnos, 2003, pg. 575.
[9] MacGRATH, Alister. Teologia para amadores. São Paulo: Mundo Cristão,
2008, pg.18.
[10] WRIGHT,
N.T. Gálatas: comentário para a formação
cristã. Rio de Janeiro: Thomas Nelson, 2023, pg.77.
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