Projeto
– “De bem com a Bíblia” – março de 2024
Professor
– Roberto da Silva Meireles Rodrigues
Livro –
Gálatas.
3º AULA – OS FALSOS MESTRES E A
INFELIDADE DOS GÁLATAS – PARTE 1:
“Estou muito surpreso em ver que vocês estão
passando tão depressa daquele que os chamou na graça de Cristo para outro
evangelho, o qual, na verdade, não é outro. Porém, há alguns que estão
perturbando vocês e querem perverter o evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós
ou mesmo um anjo vindo do céu pregue a vocês um evangelho diferente daquele que
temos pregado, que esse seja anátema. Como já dissemos, e agora repito, se
alguém está pregando a vocês um evangelho diferente daquele que já receberam,
que esse seja anátema. Por acaso eu procuro, agora, o favor das pessoas ou o
favor de Deus? Ou procuro agradar pessoas? Se ainda estivesse procurando
agradar pessoas, eu não seria servo de Cristo.” (Gálatas 1:6-10)
“Estou muito surpreso em
ver que vocês estão passando tão depressa daquele que os chamou na graça de
Cristo para outro evangelho
o qual, na verdade, não é outro. Porém, há alguns que estão perturbando
vocês e querem perverter o evangelho de Cristo.... (versos 6 e 7)”
“Estou
muito surpreso em ver que vocês estão passando tão depressa...”
– O apóstolo ao invés de usar palavras de ações de graças como de costume em
seus dias, ele faz questão de expressar o sentimento que estava nutrindo
naquele momento de descontentamento e surpresa com os irmãos em relação aos
ensinos que lhes fora ministrado por ele mesmo. Como eles, os gálatas, estavam
de forma tão fácil e rápida se desfazendo da sã doutrina, do verdadeiro
evaneglho que lhes fora ensinado pelo próprio apóstolo então pouco tempo.
“Note-se
que o verbo está na voz ativa e não na passiva, e que o tempo é o presente, não
o passado. Não é “que tenhais sido afastados tão depressa”, mas “que estejais
passando tão depressa”, ou, como diz a Bíblia na Linguagem de Hoje: “Estou
muitdo admirado de vocês estarem abandonando tão depressa”. A palavra grega
(metatithemi) é interessante. Significa “transferir a fidelidade”. É usada com
referência a soldados do exército que se rebelam ou desertam, e a pessoas que
mudam de partido na política ou na filosofia. Um certo Dionísio de Heracléia,
por exemplo, que abandonara os estóicos, tornando-se membro de uma escola
filosófica rival, insto é, um epicurista, era chamado de ho metathememos, um
“vira-casaca”. É disso que o Paulo acusa os gálatas. Eles eram vira-casacas
religiosos, desertores espirituais. E estavam abandonando aquele que os chamara
para a graça de Cristo e abraçando um outro evangelho. O verdadeiro evangelho é
na sua essência, o que Paulo diz em Atos 20:24: “o evangelho da graça de Deus”.
São as boas novas de um Deus cheio de graça para com pecadores indignos. Na
graça ele deu o seu Filho para morrer por nós. Na graça ele nos justifica
quando cremos. “Tudo provém de Deus”, como Paulo escreve em 2Coríntios 5:18,
significando que “tudo é graça”. Nada é devido aos nossos esforços, aos nossos
méritos ou às nossas obras; tudo na salvação é devido à graça de Deus.”[1]
“...daquele que os chamou
na graça de Cristo para outro evangelho...” – O estudioso do Novo Testamento Adolf Pohl pontua
que a melhor tradução não seria “na graça”, mas sim “para dentro da graça”. Ele
diz: “O chamado de Deus é para dentro, para junto de si no recinto da graça,
como num salão de festas (cf Mt 22.3; Rm 5.2; Gl 5.4; Ap 19.9)” Calvino em
seu comentário irá ressaltar que o desejo de Paulo ao usar este termo é “ressaltar
malignidade a ingratidão dos leitores”. Ele chega a dizer: “Separa-se do Filho
de Deus, sob quaisquer circunstâncias, é indigno e desonroso. Mas separar-se de
Cristo, depois de haver sido gratuitamente convidado a participar da salvação é
uma atitude mais indigna. A bondade de Cristo para conosco torna extremamente
abominável a nossa ingratidão para com Ele.” [2]
De
forma bem sintética e objetiva em seu comentário bíblico John MacArthur
conceitua teologicamente o termo “graça” usado por Paulo no verso: “Graça de Cristo. O ato de misericórdia de
Deus, de maneira gratuita e soberana, de conceder salvação pela morte e
Ressurreição de Cristo, totalmente desassociado de qualquer obra ou mérito
humano.” Esse é o cerne da soterologia[3] paulina. O homem por si
mesmo é incapaz de justificar-se. O apóstolo chega a comparar o estado do homem
pecador com o estado de um morto, ou seja, sem vida, sem possibilidade de algum
tipo de ação. Essa é a construção realizada pelo apóstolo neste versículo. É
Deus quem chama o homem para dentro de sua graça e é isso que indigna o
apóstolo. Como podem ser tão ingratos em receber algo que não lhes custou nada!
“...outro
evangelho o qual, na verdade, não é outro....” – O que seria outro evangelho? Será que existe um
outro evangelho? O que será que Paulo quis dizer ao usar essa expressão “outro evangelho”?
São muitas indagações que surgem sobre esta expressão usada pelo apóstolo
Paulo. O próprio Paulo irá responder no verso sete dizendo que “no qual não há
outro”, ou seja, ele afirma que não há outro evangelho. Na verdade, o que o
apóstolo está querendo enfatizar é o fato de que estavam adulterando o
evangelho que ele inicialmente havia ensinado aos gálatas, estavam alterando a
verdadeira boa nova de salvação.
Os gálatas por sua vez estavam aceitando de bom
grado o ensinamento herético dos falsos mestres judaizantes de um evangelho
legalista. Eles estavam começando a acreditar que era necessário a guarda da
lei de Moisés junto a obra redentora de Jesus. Era como se a obra redentora
fosse apenas o pontapé inicial, após era preciso circuncidar-se, guardar o
sábado, não comer carne de porco, etc.
O
Rev. Hernandes Dias Lopes vai dizer em seu comentário: “Esse outro evangelho a que Paulo se refere é o evangelho das obras
anunciado pelos judaizantes. A mensagem deles está sintetizada nos seguintes
termos: “Se não vos circuncidardes segundo o costume de Moisés, não podeis ser
salvos” (At 15.1). Eles negavam a necessidade da fé em Jesus par a salvação,
mas acrescentavam à fé as obras da lei. Para eles, era necessário que Moisés
completasse o que Cristo havia feito, ou seja, era preciso acrescentar nossas
obras à obra de Cristo, e assim concluir a obra inacabada de Cristo. Para o
apóstolo Paulo, a ideia de acrescentar méritos humanos ao mérito de Cristo era
repugnante. A obra de Cristo oferece salvação unicamente pela graça mediante a
fé (Ef 2.8,9). O evangelho é o único meio pelo qual os homens podem ser salvos
da condenação, pois sem o evangelho nenhuma pessoa pode ser aceita diante de
Deus. Segundo David Stern, esse outro evangelho que os gálatas abraçaram era o
legalismo. E o legalismo é o falso princípio de que Deus aceita as pessoas,
considerando-as justas e dignas de estar na sua presença, com base em sua
obediência a um conjunto de regras, e isso à parte de colocarem sua confiança
em Deus, sujeitando-se aos cuidados dele, amando-o e aceitando o seu amor por
elas.” [4]
“Porém, há alguns que estão perturbando vocês
e querem perverter o evangelho de Cristo....”
– O estudioso do Novo
Testamento Adolf Pohl registra em seu comentário a nota de que a palavra
“alguns” usada por Paulo possui o desejo de depreciar os falsos mestre.
Traduzindo para uma linguagem mais coloquial “alguns zés ninguéns”. Pohl chega
a dizer que mesmo Paulo sabendo o nome destes falsos mestres, não os cita para
que nem ao menos eles possam sentirem-se honrados com a citação de seus nomes.
Donald
Guthrie vai pontuar sobre a importância de duas palavras usadas por Paulo no
mesmo verso: “perturbar” e “perverter”. Ele diz: “A palavra usada aqui para “perturbar” (tarassontes) pode referir-se à
agitação física, distúrbio mental, ou atividade subversiva. Usada em conjunto
com a metáfora de deserção, o último destes três é preferível. Perverter: o
termo (metastrepho) significa transferir para uma opinião diferente, daí, mudar
o caráter essencial de uma coisa. A palavra não precisa subentender degeneração,
mas onde aquilo que é mudado é bom, a mudança deve envolver a ideia da
perversão, como aqui. Desta maneira, Paulo demonstra sua compreensão magistral
dos princípios por detrás da política dos falsos mestres. Uma salvação
dependente da circuncisão; e, por implicação, das observâncias legais, não era
de modo algum um evangelho verdadeiro, mas uma perversão. Vale a pena notar que
Paulo coloca sobre os falsos mestres a responsabilidade pela anomalia, ao
demonstrar que eles mesmos querem (thelontes) perverter.”[5]
Dr.
John Stott pondera sobre as duas palavras e comenta sobre a importância de
estarmos atentos ao que o apóstolo Paulo está alertando. Ele diz: “Assim, as duas características principais
dos falsos mestres eram que eles estavam perturbando a igreja alterando o
evangelho. Estas duas coisas andam juntas. Falsificar o evangelho resulta
sempre em perturbação para a igreja. Não se pode mexer no evangelho e deixar a
igreja intacta, pois esta é criada pelo evangelho e vive por ele. Na verdade,
os maiores perturbadores da igreja (agora e naquele tempo) não são os que se lhe
opõem de fora, que a ridicularizam e a perseguem, mas aqueles que dentro dela
tentam alterar o evangelho. São eles que perturbam a igreja. Inversamente, a
única maneira de ser um bom membro da igreja é sendo um bom adepto do evangelho.
A melhor forma de servir a igreja é crer no evangelho e pregá-lo.”[6]
Martinho
Lutero vai salientar que por detrás das ações destes falsos mestres está na verdade
Satanás, o verdadeiro inimigo de nossas almas. Ele pondera que o diabo está
desejoso não somente de alterar ou perturbar o evangelho, mas sim de subverter,
abolir, extinguir completamente. Ele chega de forma enfática afirmar que os
judaizantes são apóstolos não de Jesus, mas sim do diabo.
O
reformador João Calvino vai salientar da importância de conhecermos as
principais doutrinas do evangelho, pois essas doutrinas se forem atacadas e subvertidas
o evangelho será destruído. Ele pontua que Paulo termina o verso dizendo que o
evangelho é de Cristo tendo pelo menos a possibilidade de uma das duas coisas
por ele citada em sua mente. A primeira era que o evangelho revela seu próprio
autor, ou seja, o próprio Cristo, ou que Cristo é o seu próprio autor.
BILIOGRAFIA:
AGOSTINHO, Santo, Bispo de Hipona. A
Graça (II) / Santo Agostinho. São Paulo: Paulus, 1999.
CALVINO, João. Gálatas.
São José dos Campos, SP: Editora Fiel. 2007
CARSON,
D. A. / MOO, Douglas J. / MORRIS, Leon. Introdução ao Novo
Testamento. São Paulo, SP: Vida Nova, 1997.
GUTHRIE, Donald. Introdução
e comentário de Gálatas. São Paulo, SP: Vida Nova, 1984.
HALE, Broadus David.
Introdução ao estudo do Novo Testamento; São Paulo, SP: Hagnos, 2001.
HALLEY, Henry Hamptom.
Manual Bíblico de Haley. São Paulo: Editora Vida, 2001.
HENDRIKSEN, William.
Comentário do Novo Testamento – Gálatas. São Paulo, SP: Cultura Cristã, 2019.
KELLER, Timothy.
Gálatas o valor inestimável do evangelho. São Paulo: Vida Nova, 2015.
LADD, George Eldon.
Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2003.
LOPES, Hernandes Dias.
Gálatas: A carta da liberdade cristã. São Paulo, SP: Hagnos, 2011.
LUTERO, Martinho.
Martinho Lutero: obras selecionadas, v.10 – Interpretação do Novo Testamento –
Gálatas – Tito. São Leopoldo: Sinodal, Canoas: ULBRA, Porto Alegre: Concórdia,
2008.
MacARTHUR, John. Comentário
Bíblico MacArthur: desvendando a verdade de Deus, versículo a versículo. Rio de
Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2019.
MacGRATH, Alister.
Teologia para amadores. São Paulo: Mundo Cristão, 2008.
NICODEMUS, Augustus.
Livrem em Cristo – A mensagem de Gálatas para a igreja de hoje. São Paulo, SP:
Vida Nova, 2016.
POHL, Adolf.
Carta aos Gálatas: Comentário Esperança. Curitiba, PR: Editora Evangélica
Esperança, 1999.
STOTT, John R.W.
A mensagem de Gálatas: somente um caminho. São Paulo: ABU Editora, 2007.
WRIGHT, N.T.
Gálatas: comentário para a formação cristã. Rio de Janeiro: Thomas Nelson,
2023.
[1] STOTT, John R.W. A mensagem de Gálatas:
somente um caminho. São Paulo: ABU Editora, 2007, pg. 22.
[2] CALVINO, João. Gálatas. São José dos
Campos, SP: Editora Fiel. 2007, pg. 26.
[3] Soterologia – A doutrina que trata
acerca da salvação.
[4] LOPES, Hernandes Dias. Gálatas: A carta
da liberdade cristã. São Paulo, SP: Hagnos, 2011, pg.50.
[5] GUTHRIE, Donald. Introdução e
comentário de Gálatas. São Paulo, SP: Vida Nova, 1984, pg. 73.
[6] STOTT, John R.W. A mensagem de Gálatas:
somente um caminho. São Paulo: ABU Editora, 2007, pg.24.
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