quinta-feira, 14 de março de 2024

3º AULA – OS FALSOS MESTRES E A INFELIDADE DOS GÁLATAS – PARTE 1:

Projeto – “De bem com a Bíblia” – março de 2024

Professor – Roberto da Silva Meireles Rodrigues

Livro – Gálatas.

3º AULA – OS FALSOS MESTRES E A INFELIDADE DOS GÁLATAS – PARTE 1:

“Estou muito surpreso em ver que vocês estão passando tão depressa daquele que os chamou na graça de Cristo para outro evangelho, o qual, na verdade, não é outro. Porém, há alguns que estão perturbando vocês e querem perverter o evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu pregue a vocês um evangelho diferente daquele que temos pregado, que esse seja anátema. Como já dissemos, e agora repito, se alguém está pregando a vocês um evangelho diferente daquele que já receberam, que esse seja anátema. Por acaso eu procuro, agora, o favor das pessoas ou o favor de Deus? Ou procuro agradar pessoas? Se ainda estivesse procurando agradar pessoas, eu não seria servo de Cristo.” (Gálatas 1:6-10)

“Estou muito surpreso em ver que vocês estão passando tão depressa daquele que os chamou na graça de Cristo para outro evangelho o qual, na verdade, não é outro. Porém, há alguns que estão perturbando vocês e querem perverter o evangelho de Cristo.... (versos 6 e 7)”

“Estou muito surpreso em ver que vocês estão passando tão depressa...” – O apóstolo ao invés de usar palavras de ações de graças como de costume em seus dias, ele faz questão de expressar o sentimento que estava nutrindo naquele momento de descontentamento e surpresa com os irmãos em relação aos ensinos que lhes fora ministrado por ele mesmo. Como eles, os gálatas, estavam de forma tão fácil e rápida se desfazendo da sã doutrina, do verdadeiro evaneglho que lhes fora ensinado pelo próprio apóstolo então pouco tempo.

“Note-se que o verbo está na voz ativa e não na passiva, e que o tempo é o presente, não o passado. Não é “que tenhais sido afastados tão depressa”, mas “que estejais passando tão depressa”, ou, como diz a Bíblia na Linguagem de Hoje: “Estou muitdo admirado de vocês estarem abandonando tão depressa”. A palavra grega (metatithemi) é interessante. Significa “transferir a fidelidade”. É usada com referência a soldados do exército que se rebelam ou desertam, e a pessoas que mudam de partido na política ou na filosofia. Um certo Dionísio de Heracléia, por exemplo, que abandonara os estóicos, tornando-se membro de uma escola filosófica rival, insto é, um epicurista, era chamado de ho metathememos, um “vira-casaca”. É disso que o Paulo acusa os gálatas. Eles eram vira-casacas religiosos, desertores espirituais. E estavam abandonando aquele que os chamara para a graça de Cristo e abraçando um outro evangelho. O verdadeiro evangelho é na sua essência, o que Paulo diz em Atos 20:24: “o evangelho da graça de Deus”. São as boas novas de um Deus cheio de graça para com pecadores indignos. Na graça ele deu o seu Filho para morrer por nós. Na graça ele nos justifica quando cremos. “Tudo provém de Deus”, como Paulo escreve em 2Coríntios 5:18, significando que “tudo é graça”. Nada é devido aos nossos esforços, aos nossos méritos ou às nossas obras; tudo na salvação é devido à graça de Deus.”[1]

“...daquele que os chamou na graça de Cristo para outro evangelho...” – O estudioso do Novo Testamento Adolf Pohl pontua que a melhor tradução não seria “na graça”, mas sim “para dentro da graça”. Ele diz: “O chamado de Deus é para dentro, para junto de si no recinto da graça, como num salão de festas (cf Mt 22.3; Rm 5.2; Gl 5.4; Ap 19.9)” Calvino em seu comentário irá ressaltar que o desejo de Paulo ao usar este termo é “ressaltar malignidade a ingratidão dos leitores”. Ele chega a dizer: “Separa-se do Filho de Deus, sob quaisquer circunstâncias, é indigno e desonroso. Mas separar-se de Cristo, depois de haver sido gratuitamente convidado a participar da salvação é uma atitude mais indigna. A bondade de Cristo para conosco torna extremamente abominável a nossa ingratidão para com Ele.” [2]

            De forma bem sintética e objetiva em seu comentário bíblico John MacArthur conceitua teologicamente o termo “graça” usado por Paulo no verso: “Graça de Cristo. O ato de misericórdia de Deus, de maneira gratuita e soberana, de conceder salvação pela morte e Ressurreição de Cristo, totalmente desassociado de qualquer obra ou mérito humano.” Esse é o cerne da soterologia[3] paulina. O homem por si mesmo é incapaz de justificar-se. O apóstolo chega a comparar o estado do homem pecador com o estado de um morto, ou seja, sem vida, sem possibilidade de algum tipo de ação. Essa é a construção realizada pelo apóstolo neste versículo. É Deus quem chama o homem para dentro de sua graça e é isso que indigna o apóstolo. Como podem ser tão ingratos em receber algo que não lhes custou nada!

“...outro evangelho o qual, na verdade, não é outro....” – O que seria outro evangelho? Será que existe um outro evangelho? O que será que Paulo quis dizer ao usar essa expressão “outro evangelho”? São muitas indagações que surgem sobre esta expressão usada pelo apóstolo Paulo. O próprio Paulo irá responder no verso sete dizendo que “no qual não há outro”, ou seja, ele afirma que não há outro evangelho. Na verdade, o que o apóstolo está querendo enfatizar é o fato de que estavam adulterando o evangelho que ele inicialmente havia ensinado aos gálatas, estavam alterando a verdadeira boa nova de salvação.

Os gálatas por sua vez estavam aceitando de bom grado o ensinamento herético dos falsos mestres judaizantes de um evangelho legalista. Eles estavam começando a acreditar que era necessário a guarda da lei de Moisés junto a obra redentora de Jesus. Era como se a obra redentora fosse apenas o pontapé inicial, após era preciso circuncidar-se, guardar o sábado, não comer carne de porco, etc.

            O Rev. Hernandes Dias Lopes vai dizer em seu comentário: “Esse outro evangelho a que Paulo se refere é o evangelho das obras anunciado pelos judaizantes. A mensagem deles está sintetizada nos seguintes termos: “Se não vos circuncidardes segundo o costume de Moisés, não podeis ser salvos” (At 15.1). Eles negavam a necessidade da fé em Jesus par a salvação, mas acrescentavam à fé as obras da lei. Para eles, era necessário que Moisés completasse o que Cristo havia feito, ou seja, era preciso acrescentar nossas obras à obra de Cristo, e assim concluir a obra inacabada de Cristo. Para o apóstolo Paulo, a ideia de acrescentar méritos humanos ao mérito de Cristo era repugnante. A obra de Cristo oferece salvação unicamente pela graça mediante a fé (Ef 2.8,9). O evangelho é o único meio pelo qual os homens podem ser salvos da condenação, pois sem o evangelho nenhuma pessoa pode ser aceita diante de Deus. Segundo David Stern, esse outro evangelho que os gálatas abraçaram era o legalismo. E o legalismo é o falso princípio de que Deus aceita as pessoas, considerando-as justas e dignas de estar na sua presença, com base em sua obediência a um conjunto de regras, e isso à parte de colocarem sua confiança em Deus, sujeitando-se aos cuidados dele, amando-o e aceitando o seu amor por elas.” [4]

Porém, há alguns que estão perturbando vocês e querem perverter o evangelho de Cristo....” – O estudioso do Novo Testamento Adolf Pohl registra em seu comentário a nota de que a palavra “alguns” usada por Paulo possui o desejo de depreciar os falsos mestre. Traduzindo para uma linguagem mais coloquial “alguns zés ninguéns”. Pohl chega a dizer que mesmo Paulo sabendo o nome destes falsos mestres, não os cita para que nem ao menos eles possam sentirem-se honrados com a citação de seus nomes.

            Donald Guthrie vai pontuar sobre a importância de duas palavras usadas por Paulo no mesmo verso: “perturbar” e “perverter”. Ele diz: “A palavra usada aqui para “perturbar” (tarassontes) pode referir-se à agitação física, distúrbio mental, ou atividade subversiva. Usada em conjunto com a metáfora de deserção, o último destes três é preferível. Perverter: o termo (metastrepho) significa transferir para uma opinião diferente, daí, mudar o caráter essencial de uma coisa. A palavra não precisa subentender degeneração, mas onde aquilo que é mudado é bom, a mudança deve envolver a ideia da perversão, como aqui. Desta maneira, Paulo demonstra sua compreensão magistral dos princípios por detrás da política dos falsos mestres. Uma salvação dependente da circuncisão; e, por implicação, das observâncias legais, não era de modo algum um evangelho verdadeiro, mas uma perversão. Vale a pena notar que Paulo coloca sobre os falsos mestres a responsabilidade pela anomalia, ao demonstrar que eles mesmos querem (thelontes) perverter.”[5]

            Dr. John Stott pondera sobre as duas palavras e comenta sobre a importância de estarmos atentos ao que o apóstolo Paulo está alertando. Ele diz: “Assim, as duas características principais dos falsos mestres eram que eles estavam perturbando a igreja alterando o evangelho. Estas duas coisas andam juntas. Falsificar o evangelho resulta sempre em perturbação para a igreja. Não se pode mexer no evangelho e deixar a igreja intacta, pois esta é criada pelo evangelho e vive por ele. Na verdade, os maiores perturbadores da igreja (agora e naquele tempo) não são os que se lhe opõem de fora, que a ridicularizam e a perseguem, mas aqueles que dentro dela tentam alterar o evangelho. São eles que perturbam a igreja. Inversamente, a única maneira de ser um bom membro da igreja é sendo um bom adepto do evangelho. A melhor forma de servir a igreja é crer no evangelho e pregá-lo.”[6]

            Martinho Lutero vai salientar que por detrás das ações destes falsos mestres está na verdade Satanás, o verdadeiro inimigo de nossas almas. Ele pondera que o diabo está desejoso não somente de alterar ou perturbar o evangelho, mas sim de subverter, abolir, extinguir completamente. Ele chega de forma enfática afirmar que os judaizantes são apóstolos não de Jesus, mas sim do diabo.  

            O reformador João Calvino vai salientar da importância de conhecermos as principais doutrinas do evangelho, pois essas doutrinas se forem atacadas e subvertidas o evangelho será destruído. Ele pontua que Paulo termina o verso dizendo que o evangelho é de Cristo tendo pelo menos a possibilidade de uma das duas coisas por ele citada em sua mente. A primeira era que o evangelho revela seu próprio autor, ou seja, o próprio Cristo, ou que Cristo é o seu próprio autor.

           

 

 

 

 

 

 

 

 

BILIOGRAFIA:

AGOSTINHO, Santo, Bispo de Hipona. A Graça (II) / Santo Agostinho. São Paulo: Paulus, 1999.

CALVINO, João. Gálatas. São José dos Campos, SP: Editora Fiel. 2007

CARSON, D. A. / MOO, Douglas J. / MORRIS, Leon. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo, SP: Vida Nova, 1997.

GUTHRIE, Donald. Introdução e comentário de Gálatas. São Paulo, SP: Vida Nova, 1984.

HALE, Broadus David. Introdução ao estudo do Novo Testamento; São Paulo, SP: Hagnos, 2001.

HALLEY, Henry Hamptom. Manual Bíblico de Haley. São Paulo: Editora Vida, 2001.

HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento – Gálatas. São Paulo, SP: Cultura Cristã, 2019.

KELLER, Timothy. Gálatas o valor inestimável do evangelho. São Paulo: Vida Nova, 2015.

LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2003.

LOPES, Hernandes Dias. Gálatas: A carta da liberdade cristã. São Paulo, SP: Hagnos, 2011.

LUTERO, Martinho. Martinho Lutero: obras selecionadas, v.10 – Interpretação do Novo Testamento – Gálatas – Tito. São Leopoldo: Sinodal, Canoas: ULBRA, Porto Alegre: Concórdia, 2008.

MacARTHUR, John. Comentário Bíblico MacArthur: desvendando a verdade de Deus, versículo a versículo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2019.

MacGRATH, Alister. Teologia para amadores. São Paulo: Mundo Cristão, 2008.

NICODEMUS, Augustus. Livrem em Cristo – A mensagem de Gálatas para a igreja de hoje. São Paulo, SP: Vida Nova, 2016.

POHL, Adolf. Carta aos Gálatas: Comentário Esperança. Curitiba, PR: Editora Evangélica Esperança, 1999.

STOTT, John R.W. A mensagem de Gálatas: somente um caminho. São Paulo: ABU Editora, 2007.

WRIGHT, N.T. Gálatas: comentário para a formação cristã. Rio de Janeiro: Thomas Nelson, 2023.

 



[1] STOTT, John R.W. A mensagem de Gálatas: somente um caminho. São Paulo: ABU Editora, 2007, pg. 22.

[2] CALVINO, João. Gálatas. São José dos Campos, SP: Editora Fiel. 2007, pg. 26.

[3] Soterologia – A doutrina que trata acerca da salvação.

[4] LOPES, Hernandes Dias. Gálatas: A carta da liberdade cristã. São Paulo, SP: Hagnos, 2011, pg.50.

[5] GUTHRIE, Donald. Introdução e comentário de Gálatas. São Paulo, SP: Vida Nova, 1984, pg. 73.

 

[6] STOTT, John R.W. A mensagem de Gálatas: somente um caminho. São Paulo: ABU Editora, 2007, pg.24.

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