Rio de Janeiro, 24 de setembro de 2025.
INSTITUTO BÍBLICO EFATÁ
MÓDULO DE TEOLOGIA DO NOVO TESTAMENTO
2ª AULA – O REINO DE DEUS NOS
EVANGELHOS SINÓTICOS
PROFESSOR – PR. ROBERTO DA SILVA
MEIRELES RODRIGUES
INTRODUÇÃO:
É
bem provável que o tema mais tratado por Jesus nos evangelhos Sinópticos[1]
é o Reino de Deus. Ao iniciarmos uma leitura mais atenta dos evangelhos
percebemos uma gama de vezes que Jesus ensina sobre o assunto.
O
texto de Marcos 1.14-15 diz: “Depois que
João foi preso, Jesus foi para a Galileia, pregando o evangelho de Deus e
dizendo: completou-se o tempo, e o reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e
crede no evangelho”. O texto revela-nos o Senhor Jesus iniciando seu
ministério. E o conteúdo de sua mensagem era exatamente sobre o Reino Deus.
Porém,
quando falamos acerca do Reino de Deus, a impressão que temos é que falamos de
algo que não é conhecido. Parece que estamos trazendo um novo ensinamento, uma
nova doutrina, algo novo. Talvez pela falta de ênfase de nossas igrejas com a
educação teológica.
Visando
esclarecer as dúvidas acerca do tema. Inicialmente tentarei responder as
seguintes perguntas: O que é o Reino de Deus? O que Jesus queria dizer quando
falava sobre o Reino de Deus? Qual o interesse desse assunto para a nossa vida
cristã hoje? E algumas outras problemáticas existentes no permear de nossa
cosmovisão.
A VISÃO DO VELHO TESTAMENTO SOBRE O
REINO DE DEUS.
O Velho Testamento apresenta o
Senhor como Rei em muitos textos. Essa expressão de Deus como Rei
veterotestamentária implica diretamente na questão do atributo divino da
Soberania. Ou seja, desde o Antigo Testamento os israelitas já conheciam e
reconheciam a Soberania de Deus sobre sua nação e sobre todos os povos da
terra. Vejamos alguns textos que nos respaldam enquanto a esta afirmação:
“O Senhor reinará eternamente” (Êxodo
15.18).
“Nenhuma desgraça se vê em Jacó,
nenhum sofrimento em Israel. O Senhor, o seu Deus, está com eles; obrado de
aclamação do Rei está no meio deles” (Números 23.21).
“E Ezequias orou ao Senhor: “Senhor,
Deus de Israel, que reina em teu trono, entre os querubins, só tu és Deus sobre
todos os reinos da terra. Tu criaste os céus e a terra”” (II Reis 19.15).
“O Senhor assentou-se soberano sobre
o dilúvio; o Senhor reina soberano para sempre” (Salmos 29.10).
“Eu Sou o Senhor, o Santo de vocês, o
Criador de Israel e o seu Rei” (Isaías 43.15).
Mas o Velho Testamento apresenta
também o Senhor que se tornará Rei. Essa conotação Veterotestamentária
apresenta a descrição profética acerca da pessoa do Messias, que teve o seu
cumprimento na pessoa de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Vejamos alguns
textos que nos respaldam o quanto a isso:
“A lua ficará humilhada, e o sol,
envergonhado; pois o Senhor dos Exércitos reinará no monte Sião e em Jerusalém,
glorioso na presença dos seus líderes! (Isaías 24.23).”
“Pois o Senhor é o nosso juiz, o
Senhor é o nosso legislador, o Senhor é o nosso rei; e ele nos salvará.”
(Isaías 33.33).
“Como são belos nos montes os pés
daqueles que anunciam boas novas, que proclamam a paz, que trazem boas
notícias, que proclamam salvação, que dizem a Sião: O seu Deus reina!” (Isaías
52.7).
“O Senhor anulou a sentença contra
você, ele fez retroceder os seus inimigos. O Senhor, o Rei de Israel, está em
seu meio; nunca mais você temerá perigo algum”. (Sofonias 3.15).
“O Senhor será rei sobre toda a
terra. Naquele dia haverá um só Senhor e o seu nome será o único nome”.
(Zacarias 14.9).
Como anteriormente mencionamos, os
israelitas criam que Deus era soberano e por este motivo reinava sobre a vida
de sua nação (Israel) e sobre os povos vizinhos. Porém, ao lermos os versículos
acima supracitados podemos entender que Israel nutria a esperança sempre do
rompimento divino na história buscando a salvação de seu povo.
Essa percepção de salvação não era
somente um anseio por um futuro próximo, mas também de um futuro escatológico.
Ou seja, em muitas mensagens proféticas o juízo de Deus se daria de fato neste
tempo presente. E, em outros casos, em um parecer final de Deus na história.
Porém, de uma forma não tão clara,
Israel
aguardava a vinda do Reino de Deus. Vejamos o que diz Dr. Ladd:
“De qualquer modo, em
toda a extensão do judaísmo, a vindo do Reino de Deus foi aguardada como um ato
de Deus – talvez utilizando agentes humanos – para derrotar os inimigos ímpios
de Israel e reunir este povo disperso, vitorioso sobre seus inimigos, em sua
terra prometida, unicamente sob o domínio de Deus”.[2]
O SIGNIFICADO DA EXPRESSÃO BASILEIA
TOU THEOU (REINO DE DEUS).
Segundo
Dr. Ladd a melhor maneira de entendermos o real sentido desta expressão “Basileia Tou Theou” é da forma pela
qual o Senhor é Rei e Soberano em nossas vidas neste tempo presente, mas também
se tornará de forma plena na consumação do mundo em sua Parousia[3].
Jesus ao encarnar implantou o Reino
de Deus entre nós. Ao romper as esferas temporais, Jesus trouxe a possibilidade
obtermos valores que são Eternos, neste tempo presente. Através de seu
sacrifício Ele nos possibilitou sermos salvos hoje, mas também sermos salvos no
futuro de duas formas: em sua Parousia, ou através de nossa morte.
Diferentemente do Antigo Testamento
onde ocorriam manifestações do Reino de Deus em períodos específicos. Através
da pessoa de Jesus o Reino de Deus foi implantando na esfera temporal para ser
consumado na esfera Eterna.
O DUALISMO CÓSMICO (O JÁ MAIS AINDA
NÃO)
Ao
entendermos que o Reino de Deus sempre esteve presente no Antigo Testamento em
paralelo a este presente século. Tendo irrupções em momentos específicos da
história por Deus como nos seguintes episódios: dilúvio, êxodo, cativeiro
babilônico, etc.
Fica fácil entender a implicação do
Reino de Deus entre nós. O Reino sempre existiu de fato e de direto no governo
e na Soberania do Senhor Deus, ou seja, Deus sempre esteve no controle da
história na Eternidade. Porém, ao próprio Deus encarnar ele trouxe a Eternidade
para o tempo presente, apontando para uma consumação futura. A encarnação
possibilitou a implantação do Reino de Deus e a ressurreição possibilitou a
esperança na consumação do mesmo.
O REINO COMO UM DOM PRESENTE.
Jesus ao falar sobre a o Reino ele
colocou em paralelo ao ensino da Eternidade. Vejamos o que Ladd diz: “Em resposta à pergunta do mancebo as condições de herdar a vida Eterna
(Mc. 10.17), Jesus referiu-se a entrar no Reino (10.23,24) e receber a vida
eterna (10.30) como se esses fossem conceitos sinônimos. O Reino é um dom que o
Pai se agrada em conferir ao pequeno rebanho dos discípulos de Jesus (Lc.12.32).”[4]
Jesus disse que o Reino deve ser
recebido a semelhança das crianças. As crianças no ensino de Jesus denotam a
confiança no Pai, denotam uma atitude responsiva, denotam a satisfação em
receber uma dádiva (um presente), elas se encaixam perfeitamente no sermão do
monte quando o Senhor Jesus diz que os que pedem recebem e os buscam acham (Mateus
7.7).
Devemos ter um coração como o de uma
criança para sermos gratos ao nosso Deus por podermos fazer parte do grupo de
discípulos de Jesus a quem é permitida a entrada no Reino dos Céus.
Creio que seja por este motivo que
Lewis expressou a euforia da dádiva do presente do Reino através dos olhos dos
quatro reis ao entrar em Nárnia. O olhar de uma criança ao receber um presente
de fato demonstra a veracidade acerca de um presente que ganhou.
O DOM DA SALVAÇÃO.
O dom da salvação se encontra nos evangelhos
de duas formas: a salvação escatológica e a comunhão com Deus. Hoje podemos
experimentar estas duas esferas mesmo neste tempo presente. Somos salvos e por
este motivo Jesus nos propicia através de seu sacrifício entrarmos na presença
do Pai e desfrutarmos de Sua Santa Presença.
No futuro, ou em nossa morte, ou
através da vinda do Senhor Jesus iremos desfrutar da salvação da morte,
ressuscitando em um corpo glorificado que desfrutará de uma plena comunhão no
céu com nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
Podemos perceber que alegria da
salvação é experimentada neste tempo presente através da parábola do filho
pródigo, a dracma perdida, o encontro de Jesus com Zaqueu e alguns outros
textos dos evangelhos. E em relação a comunhão basta nos olharmos para o fato
de Jesus participar da comunhão (refeições) com os pecadores no tempo presente.
O DOM DO PERDÃO.
Ao
olharmos a atitude de Jesus em algumas passagens ao falar sobre o perdão, nós
podemos verificar como os líderes religiosos ficavam irados, pois segundos
eles, “quem era Jesus para perdoar pecados”, afinal de contas, só Deus, têm
esse poder.
Quando Jesus em Marcos 2 utiliza a
expressão Filho do Homem, ele está se referindo a figura messiânica de Daniel
7.13, e Ele diz que essa promessa messiânica se cumprira n’Ele, Jesus.
Ladd vai dizer que “Jesus não ensinou uma nova doutrina acerca
do perdão; Ele trouxe aos pecadores perdidos uma nova experiência de perdão”.
Quando Jesus disse a mulher na casa de Simão que seus pecados estavam
perdoados. Ele não disse que Deus a estava perdoando, ou falou sobre a salvação
em Deus. Ele foi taxativo: “Os teus pecados estão perdoados”. (Lc. 7.48)
Jesus em sua encarnação propiciou a
humanidade, aquilo que os profetas no Antigo Testamento haviam prometido
somente no futuro, como benção escatológica do Reino Eterno de Deus.
A DÁDIVA DA JUSTIÇA.
Nos ensinos de Jesus a justiça não é
alcançada pelos méritos humanos, por uma busca da perfeição através de uma
ética e moral intocáveis. Mas os ensinos de Jesus nos apontam a justiça como
algo outorgado como Graça através da entrada do individuo no Reino de Deus. Por
este motivo ele diz que nós devemos buscar primeiro o Reino de Deus e sua
Justiça (a justiça é Deus e não nossa).
De modo que automaticamente ao
buscarmos o Reino de Deus somos justificados pelo Deus do Reino, que somente
Ele, e através de seus próprios méritos, podemos alcançar tal Graça diante de
Deus.
Ter a justiça excedida dos escribas
e fariseus, não significa sermos padrões taxativos de justiça. Mas significa
sermos participantes de Reino que é Justo, por que o seu Rei é Justo. Aleluia!
E com esta cosmovisão que devemos
olhar para o texto de Lc. 18.14, sobre a parábola do Escriba e Publicano em
suas respectivas orações. Diz Jesus que o Escriba que se achava irrepreensível
perante a prática da lei, não foi justificado pela mesma, e não foi justificado
por Deus, devido ao seu coração altivo e suficientemente soberbo. Já o
publicano, que não se achava merecedor de nada, indigno, pecador. Saiu daquele
lugar, justiçado pelo próprio Deus, que o faz por Ser Justo e Bom.
Ao olharmos para todos os
ensinamentos de Jesus nos evangelhos sobre justiça. Podermos sempre sinalizar
que o padrão exigido por Jesus é alto demais. E por este motivo impossível de
pecadores como nós alcançarmos tal justiça. A não ser que, Deus nos capacite
para o mesmo.
CONCLUSÃO.
Gostaria de finalizar este estudo
com as palavras do Dr. George Eldon Ladd que diz:
“A
missão de Jesus não significou um novo ensinamento, mas um novo evento. Ela trouxe
aos homens uma prova real e presente da salvação escatológica. Jesus não
prometeu o perdão dos pecados; Ele os conferiu. Ele não somente assegurou aos
homens a comunhão futura; mas convidou-os a comunhão com sua própria pessoa
como aquele que inaugurou o Reino. Não somente prometeu-lhes vindicação no dia
do juízo; mas conferiu-lhes uma justiça presente. Não apenas ensinou-lhes um
livramento escatológico do mal físico; mas veio demonstrar o poder remidor do
Reino, livrando os homens da enfermidade e até da morte”.
[1] A palavra Sinópticos quer
dizer “ver em conjunto”, ela é derivada
do grego (synopsis). Foi utilizada pela primeira vez por um teólogo alemão
chamado J.J.Griesbach, devido à semelhança encontrada nos evangelhos de Mateus,
Marcos e Lucas acerca do ministério de Jesus.
[2] LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo:
Hagnos.2003.pg. 89.
[3] É o termo
teológico utilizado para descrever a volta de Cristo de forma escatológica. A
palavra no grego tem o seguinte significado “pará” (ao lado) e “ousia”
(estando), significando “estando ao lado” de forma literal.
[4] LADD,
George Eldon. Teologia do Novo
Testamento. São Paulo: Hagnos.2003.pg. 102.
Nenhum comentário:
Postar um comentário