Rio de Janeiro, 22 de outubro de 2025.
INSTITUTO BÍBLICO EFATÁ
MÓDULO DE TEOLOGIA DO NOVO TESTAMENTO
6ª AULA – INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO DE PAULO
PROFESSOR – PR. ROBERTO DA SILVA MEIRELES RODRIGUES
INTRODUÇÃO:
Acredito que seja unanimidade entre
os estudiosos do Novo Testamento, o fato de Paulo realizar a mais notável
interpretação do significado da vida e da obra da pessoa de Jesus Cristo nosso
Senhor. Paulo, o mesmo que outrora chamava-se Saulo, um fariseu convertido ao
evangelho de Jesus Cristo após cair do cavalo na estrada de Damasco.
Se torna bastante complexo entender
o pensamento do apóstolo Paulo pelo fato dele ser um cidadão de três culturas:
judaico, helênica e cristã. Paulo nasceu na cidade de Tarso, na Cilícia. Porém,
sua mãe e sua avó eram judias. Portanto, foi criado em um lar judeu, segundo os
costumes mais severos do judaísmo farisaico.
Vale ressaltar que Paulo cita que
obteve sua educação na escola rabínica do famoso rabino Gamaliel.
Provavelmente, Paulo deva ter se mudado para Jerusalém ainda quando criança e
por este motivo pode ser educado, como ele próprio se refere, “aos pés de
Gamaliel”. (Atos 22.3)
Sua compreensão e familiarização com
o mundo grego-romano o permitiu dialogar com a cultura e com as pessoas na
plantação de igrejas espalhando o evangelho por todo o império. Só conseguimos
compreender a conversão de Paulo e a mudança em seus discursos a partir da
crença de que o mesmo realmente se converteu a Jesus Cristo e a partir de então
teve uma nova perspectiva acerca da lei.
“Diante
do fato do próprio Paulo afirmar que recebeu uma educação teológica rabínica
antes de tornar-se cristão, a abordagem correta parece a aceitar essa afirmação
e interpretar o pensamento Paulino de acordo com um fundamento judeu, porém ter
em mente, nos pontos mais importantes, a possibilidade de influência
helenística ou protognósticas”. [1]
PAULO,
O JUDEU:
A teologia de Paulo era a de um
judeu ortodoxo. Ele era um monoteísta (Cl. 2.18); era contra a idolatria (1 Co.
10.14, 21); contra a imoralidade (Rm. 1.26); considerava o Antigo Testamento
como Escritura Sagrada (Rm. 1:2; 4.3); A palavra de Deus como divinamente
inspirada por Deus. (1 Tm. 3.16). Seu método de interpretação do Antigo
Testamento o categoriza como um tradicional rabino judeu.
O ainda Saulo criado e educado como
fariseu nutria a expectativa da revelação messiânica. O tão anunciado e
aguardado dia do Senhor. A expectativa escatológica se concentrava no anseio do
dia em que Deus iria vingar seu povo e estabelecer por completo seu Reino sobre
os inimigos de Israel.
Talvez “conversão” não seja a melhor
palavra para descrever a experiência de Saulo na estrada de Damasco. Tendo em
vista que em nossa cultura fica sempre submetido que a conversão é a mudança
radical de uma pessoa descrente que leva uma vida com comportamentos imorais
que está diretamente contra os princípios e valores da Palavra de Deus. E, esse,
não era o caso de Saulo. Ele era um religioso, fariseu, extremamente zeloso na
guarda da lei e nas tradições de seus pais. Ladd pontua que talvez a melhor forma
de expressar a experiência de Saulo na cidade de Damasco seja sua mudança de
percepção em relação ao entendimento da justiça. No primeiro momento como
fariseu ele acreditava em uma justiça própria, mas ao encontrar-se com Jesus entendeu
que não podia justificar-se diante de Deus e que sua justiça seria lhe
outorgada pela fé através dos méritos do sacrifício de Jesus.
“Chegar
à conclusão de que Jesus era realmente o Messias, era algo demasiadamente
revolucionário para a avaliação de Saulo em relação a todo o significado da
Lei, pois foi o seu zelo pela Lei que o fizera odiar os cristãos e o seu
Messias. Jesus não havia sido condenado por homens irreligiosos, imorais, mas
por judeus conscienciosos, devotos, que acreditavam estar defendendo a Lei de
Deus. Foi o melhor do judaísmo que levou Jesus à cruz. Se o esforço de Paulo para estabelecer a
justiça por meio da Lei o havia cegado para a verdadeira justiça de Deus no
Messias (Rm. 10:3), então a Lei não poderia ser um caminho de justiça. O
judaísmo tinha de estar errado ao entender a Lei como o caminho da justiça. Foi
essa certeza que trouxe a Paulo a convicção de que Cristo era o fim da Lei,
como o caminho para a justiça (Rm. 10:4). Assim, toda a essência da teologia de
Paulo - Jesus como o Messias, o evangelho para os gentios, a justificação pela
fé e não pelas obras da Lei - está contida em sua experiência no caminho de
Damasco”.[2]
EIS QUE TUDO SE FEZ NOVO:
O apóstolo Paulo precisou rever seu
entendimento acerca da história da redenção. Ele continuou crendo e aguardando
pelo Dia do Senhor, pelo retorno do Messias em poder e glória para estabelecer
seu Reino escatológico. Ladd diz que ele não abandona algumas de suas
convicções: o esquema judaico das duas eras e do caráter mau da era presente
(Gl. 1.14). Poderes demoníacos se opõe ao povo de Deus (Ef. 6.12), que ainda
está sujeito aos males físicos, às doenças (Rm. 8.35; Fp. 2.26) e a morte (Rm.
8.21), e o espírito mundano da sociedade humana está em oposição ao Espírito de
Deus. O mundo está sob julgamento divino (1 Co. 11.32). Os crentes ainda vivem
no mundo e fazem uso do mundo (1 Co. 7.31), e não podem evitar associação com
os homens deste mundo (1 Co. 5.11). Em sua percepção o Reino de Deus permanece
como uma esperança escatológica em sua totalidade do ponto de vista da
natureza, história e da cultura.
Destarte, sendo Jesus o Messias Ele
trouxe ao seu povo a salvação messiânica, o que significa que algo mudou dentro
da perspectiva de como se deve entender a história da redenção. O Reino de
Cristo agora é uma realidade presente, realidade ao qual os seus súditos foram
trazidos, mesmo que as pessoas deste mundo não possam ver e nem crer (Cl. 1.13).
Dentro da perspectiva paulina o reinado de Jesus não irá começar na parousia,
ao contrário, seu reinado já começou com sua ressurreição e exaltação. Assim
Cristo já está reinando através da igreja e ao derrotar todos os seus inimigos
entregará o Reino a Deus.
O apóstolo Paulo a partir deste
momento muda completamente sua forma de pensar em relação a forma de pensar a história
da redenção. O pensamento judaico enxergava a salvação como algo apenas
escatológico, ou seja, nada aconteceria neste século presente, apenas no século
futuro. Porém, Paulo começa a enxergar e a ensinar que a ressurreição é um
evento escatológico, porém esse processo já teve início como a ressurreição de
Jesus neste tempo presente, por esse motivo o apóstolo usa uma analogia
extraída da agricultura para dizer que Jesus é as “primícias” dos que dormem (1
Co. 15:21-21).
“Paulo faz um contraste entre a morte, que
entrou neste mundo por meio de um homem, e a ressurreição dentre os mortos, que
também entrou neste mundo por intermédio de um homem. A ressurreição acontece
em diferentes estágios: Cristo, as primícias, é o primeiro estágio da
ressurreição; o segundo estágio consistirá daqueles que pertencem a Cristo na
sua vinda (1 Co. 15:21-23). O ponto importante aqui é que a ressurreição de
Cristo é o começo da ressurreição como tal, e não um acontecimento isolado. A
ressurreição de Jesus é de fato o começo da esperança escatológica. A
ressurreição dos mortos não será mais um simples evento a acontecer em
determinada época no fim dos séculos; a ressurreição foi dividida em pelo menos
dois estágios, o primeiro dos quais já aconteceu. Pelo fato da ressurreição já
ter começado, o homem em Cristo sabe que há uma ressurreição para ele no
futuro. O primeiro ato do drama da ressurreição escatológica foi separado do
restante da peça e retornou ao meio do presente século mau.
Essa interpretação está fundamentada na
expressão "as primícias". As primícias constituem o começo da própria
colheita. Embora essa expressão não seja sinônima da colheita em sua
totalidade, as primícias são mais do que flores e folhas e frutos verdes; pois
são os frutos maduros, prontos para a colheita; e por serem as primícias, são
também a promessa e a garantia de que a colheita total acontecerá brevemente. A
ressurreição dos crentes relaciona-se à ressurreição de Jesus, assim como a
colheita total está relacionada à colheita dos primeiros frutos. Esses dois
fatos são idênticos em qualidade; as únicas diferenças são a quantitativa e a
temporal”.[3]
Essa
mesma lógica de pensamento serve para o entendimento judaico acerca do derramamento
do Espírito sobre toda carne. O Antigo Testamento considerava o derramamento do
Espírito sobre toda carne um evento escatológico, que aconteceria no Dia do
Senhor prosseguido do julgamento messiânico e a salvação. Paulo agora ensina
que a completa experiência com o Espírito Santo se dará em um evento
escatológico quando ganharmos “corpos espirituais”, ou seja, a perfeita
experiência com o Espírito Santo se dará com a redenção do corpo físico (Rm.
8.23).
“Em outras passagens, Paulo descreve esse
mesmo gozo escatológico do Espirito Santo em termos de um pagamento inicial.
Deus nos selou com o Espírito Santo prometido, "o qual é o penhor da nossa
herança, para redenção da possessão de Deus" (Ef. 1:14; veja também 2 Co.
1:22; 5:5). Aqui, fala-se do Espírito Santo como um arrabon, palavra que
significa um pagamento ou garantia, dada para assegurar a consumação de uma
transação. Um arrabon é uma promessa, porém é mais do que uma promessa; é
também a realização. E um dinheiro depositado, que tanto promete o pagamento
total no futuro como fornece um pagamento parcial no presente. Esta é a dádiva
do Espírito na era atual; é o depósito ou pagamento, que é ao mesmo tempo a
garantia da herança escatológica futura, que será adquirida na ressurreição.
Aqui, novamente, a dádiva escatológica é dividida em duas porções; a primeira
tornou-se uma experiência presente, mas a plenitude permanece objeto de uma
realização escatológica futura. A ressurreição é tanto história como
escatologia; a vida do Espírito é tanto experiência como esperança; o Reino de
Deus é tanto presente como futuro; a benção do século futuro permanece, em sua
plenitude, como objeto de desejo e esperança; contudo, estas próprias bênçãos,
em parte, retornaram à presente era demoníaca, por causa das modificações da
estrutura antitética e tornaram-se, em Cristo, os temas da experiência cristã
atual”.[4]
Essa
nova percepção de Paulo sobre a história da redenção está resumida em 2
Coríntios 5:16-17: “Assim, daqui por
diante não reconhecemos ninguém segundo os padrões humanos. E ainda que
tenhamos conhecido Cristo segundo os padrões humanos, agora não o conhecemos
mais desse modo. "Portanto, se alguém está em Cristo, é nova
criação; as coisas velhas já passaram, e surgiram coisas novas".
O ÂMAGO DA TEOLOGIA DE PAULO:
“Será
que há algum conceito unificador, a partir do qual a teologia de Paulo possa se
desenvolver? As soluções para este problema, geralmente, centralizam-se tanto
na justificação pela fé como na experiência mística de se estar em Cristo... A
Teologia de Paulo é a exposição dos novos fatos redentores; a características
comum em todas suas ideias teológicas é seu relacionamento com o ato histórico
de Deus da salvação em Cristo. O significado de Cristo é a inauguração de uma
nova era de salvação. Na morte e na ressurreição de Cristo, as promessas da
salvação messiânica do Antigo Testamento se cumpriram, mas dentro da era
antiga. O novo adentrou a estrutura do Antigo; porém o novo também está
destinado a transformar o antigo. Logo, a mensagem de Paulo é tanto uma
escatologia realizada como futura” [5]

Nenhum comentário:
Postar um comentário